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Segunda-feira, 17 de Dezembro de 2012

Inês

 

Inês de Castro foi executada em 7 de Janeiro de 1355. D. Dinis morre em 7 de Janeiro de 1325, i.e. exactamente 30 anos antes. Estes dois episódios podiam parecer uma mera coincidência, mas se juntarmos outros factos ganha força a intencionalidade da data. Inês de castro não foi assassinada - no sentido de delito comum – mas sim executada na sequência de uma pena decretada pelas instituições vigentes à época: o Rei D. Afonso, o meirinho-Mor Álvaro Gonçalves (uma espécie de ministro da Justiça) e os seus conselheiros Diogo Lopes Pacheco e Pero Coelho. Ou seja, a pena foi decretada e executada numa data escolhida pelo Rei. Porque motivo D. Afonso IV escolheu esta data? Certamente não a ignorara. Creio que foi uma vingança relativamente a seu pai e a seu irmão bastardo. Relembremos que D. Afonso IV moveu uma guerra ao seu pai porque entendia que este ao nomear Afonso Sanches, seu meio-irmão, mordomo-mor (primeiro ministro, na designação actual) estava a entregar-lhe o poder e a facilitar o seu caminho para lhe suceder no trono, em detrimento de D. Afonso IV, que era o único filho legítimo. Esta guerra acabou com a vitória de D. Afonso IV, mantendo-se Dom Dinis no poder até à morte mas numa função quase simbólica. E Inês, porquê? Inês de Castro foi criada em Albuquerque (Castela), precisamente no local onde se fixou Afonso Sanches após a guerra entre seu pai e meio-irmão. Em Albuquerque ele e a sua mulher Dª. Teresa Sanches foram uma espécie de pais adoptivos desta fidalga (por via de 2 bastardias). Foi em Albuquerque que Inês de Castro se fixou, por exemplo, quando D. Afonso IV a expulsou na sequência da visibilidade dos seus amores com Pedro. O problema não era o Infante ter amantes (todos as devem ter tido) mas geralmente eram de condição maia baixa. Com a morte da Rainha Dona Constança, Pedro mandou regressar Inês, vivendo com ela primeiro no Paço de Moledo e mais tarde num anexo do Convento de Santa Clara, local onde os executores a degolaram. Para esta teoria contribui outro facto. Em Castela da-se um levantamento contra o Rei Pedro “o Cruel” onde estão envolvidos vários fidalgos castelhanos, entre os quais os irmãos de Inês de Castro, os filhos bastardos do rei Afonso XI (que dariam lugar á dinastia de Trâstamara), e o filho de Afonso Sanches, o célebre João Manuel “do Ataúde” (ataúde era um caixão, e as teorias para este epíteto são muitas e pouco convincentes). Através de Inês de Castro, os irmãos Castro (este apelido parece destinado ao plural) tentaram seduzir o Príncipe Português para o seu partido, e este, ingenuamente, sentiu-se tentado a aderir, confiando que lhe entregariam a coroa de Castela de mão-beijada. Bem sizudo foi D. Afonso IV em não querer meter-se num assunto que nunca traria nada de bom para Portugal. Só nos meteria numa guerra sem proveito, como faria o neto de Afonso IV, Dom Fernando. Nesse sentido, Dom Afonso IV, não hesitou. O melhor, do ponto de vista pragmático, era matar o Príncipe. Mas como era seu filho e único sucessor, a única forma era matar Inês de Castro, castigando ao mesmo tempo o seu irmão bastardo, o seu sobrinho (cabecilha da revolta) e o seu pai, Dom Dinis. É errado dizer que foi por o Príncipe querer casar com Inês que o Rei a mandou executar. Várias fontes da época, como Fernão Lopes, Rui de Pina e o próprio Diogo Lopes Pacheco (um dos executores de Inês), referem-no, que o Rei D. Afonso IV questionara o filho se ele casou ou fazia tenção de o fazer, para que se pudesse dar o tratamento devido a Inês de Castro. O Príncipe sempre negou que tinha casado e disse-o que nunca o faria. Apenas 3 anos após subir ao trono é que o afirmou solenemente em Cantanhede e em Coimbra. Mas nem se lembra do dia nem da data, nem sequer o Bispo que supostamente os casou em Bragança – D. Gil. Apenas um seu privado, Estevão Lobato, avançou com uma data, imagine-se, o 1º de Janeiro. Como seria possível, caso se tivessem efectivamente casado, esquecer esta data, e ainda por cima numa data tão facil de memorizar. E porque motivo apenas o afirma 3 anos após ser Rei? A teoria do medo da reacção de D. Afonso IV não convence, porque este já não estava no mundo dos vivos. A questão do beija-mão e da coroação após a morte é mais uma lenda. Como é que se poderia coroar uma mulher a quem tinham arrancado a cabeça com um machado? E colocavam-na num trono sem a cabeça para lhe beijarem a mão? Nenhuma fonte da época o refere, nem sequer Camões. Acredita-se, por acaso, se este episódio fosse conhecido à época de Camões, que este perderia o ensejo para o colocar nos “Lusíadas”, onde dá grande destaque ao episódio? Mais uma lenda criada pelos autores românticos do século XVIII. Para concluir e em súmula, creio que o episódio de Inês de Castro foi uma vingança de D. Afonso IV relativamente ao seu pai e seu irmão bastardo, motivada por um cenário real de perigo para Portugal. Com a morte de Inês de castro D. Afonso IV conseguia atingir 2 objectivos: Vingança de quem o tentou afastar do trono (na sua perspectiva, claro) e paz no Reino. Não esperava talvez a reação do infante, que tentou assenhoriar-se do Porto (não seria o últimoRei com este nome a fazê-lo num contexto de guerra civil) Dom Pedro fixa-se em Canavezes onde selou a paz com o pai, na presença do Arcebispom de Braga. Não cumpriu com as disposições que jurou sobre os evangelhos, pelo menos no tocante à amenistia dos executores de Inês. Quando o Rei. Dom Afonso IV já agonizava os executores, desconfiados das intenções do Infante, fugiram para Castela, pensando que lá estariam em segurança. Enganaram-se. Numa troca de prisioneiros com o seu sobrinho, também Pedro e também cruel, Alvaro Gonçalves e Pero Coelho foram entregues à sua justiça, mandando-lhe arrancar o coração ainda vivos. Um pelas costas e outro pelo peito. Lopes Pacheco, por sorte e pela ajuda de um pastor – assim nos conta Fernão Lopes - conseguiu fugir para Aragão voltando mais tarde ao Reino por amenistia do Rei. Ao revisitar o tema da morte de Inês de Castro estou a entrar em contradição com aquilo que penso que foi a importância deste episódio na nossa História: nenhuma. Pode-se questionar esta teoria com base na reacção violenta do Príncipe, nos túmulos reais - talvez mais belos que tivemos em toda a nossa História - mas em termos daquilo que foi a nossa trajectória como povo, este episódio está claramente inflacionado. Contudo, este drama, em grande parte impulsionado por Camões e pelos literatos românticos, continua a fascinar-nos e eu não fico imune ao seu poder sedutor. Acontece que à medida que o tempo vai passando, vou lendo mais sobre o assunto e reflectindo sobre o emaranhado de factos que originaram este episódio, e creio que neste momento cheguei uma teoria definitiva (para mim, claro) sobre a morte de Inês de Castro.

publicado por Rui Romão às 09:49
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Domingo, 10 de Junho de 2012

Dia de Camões

 

Hoje comemora-se o dia de Portugal. Outrora denominado por “Dia da Raça”, tem actualmente a designação de Dia de Portugal, Camões e das Comunidades Portuguesas. É motivo de orgulho para um país onde os eternos “Velhos do Restelo” tudo deturpam, tudo vilipendiam, tudo apequenam, que o dia da nacionalidade seja alusivo a um poeta. É óbvio que não se trata de um poeta qualquer, trata-se do poeta mais influente da língua portuguesa. Não digo que seja o maior poeta português, porque teve que rivalizar, já praticamente nos nossos dias, com a sombra de Fernando Pessoa. Não se pode dizer que a poesia pessoana seja no seu épico “A mensagem” comparável com os “Lusíadas”. A diferença é que Pessoa foi muito para além da epopeia (de cariz marcadamente sensacionalista, bem distante do barroco literário de Camões), numa obra que, segundo um seu biógrafo recente, chegaria às 30.000 páginas, num total de mais de 200 heterónimos. Pessoa é hoje um poeta cosmopolita, cuja projecção externa suplanta largamente a de Camões, cuja obra, por ser quase obcessivamente portuguesa, não demonstra a mesma capacidade de se impôr no exterior. Fernando Pessoa, no imenso acervo de papéis, que inclui inúmeras cartas pessoais, deu a sua opinião sobre quase todas as figuras de relevo do seu tempo. Nesse particular, mostrou ter uma língua particularmente viperina, não poupando personalidades do seu tempo até então quase sagradas, como Eça de Queirós (a quem chama provinciano), Afonso Lopes Vieira (denunciando a sua infantilidade) ou Guerra Junqueiro, poeta que admirava na juventude mas que mais tarde consideraria “fraco” (António Sérgio era da mesma opinião).

Sobre Camões, Pessoa escreveria que tinha uma obra muito desigual. A lírica não tinha rasgo, sendo de valor sobretudo o épico. No entanto, mesmo no épico, denuncia a falta de imaginação, que segundo ele não foi além da figura do Adamastor. Curiosamente, a mesma crítica – falta de imaginação – lhe é apontada pelo Brasileiro José Paulo Cavalcanti Filho, embora o biógrafo limite essa característica apenas à escolha de situações e nomes, que Pessoa retirava do que lhe estava próximo (objectos e pessoas), num exercício que apesar de interessante, não fecha a porta à especulação.

Devo dizer que não me posso rever na crítica que Pessoa faz à obra de Camões. Em primeiro lugar, porque a lírica camoniana é bastante interessante, pnão fosse ela profundamente autobiográfica. Num poeta que não deixou rasto nem documentos (para além da sua prisão na Cadeia do Tronco, por dar uma cutilada num empregado do paço) a sua lírica é fundamental para encontrar o fio condutor da sua vida. Para além do interesse autobiográfico, a lírica camoniana tem igualmente poemas onde o poeta coloca todo o seu génio e talento, como por exemplo na Canção X.

Quanto ao épico "Lusiadas", é revelador de uma sólida cultura, dos clássicos e também das crónicas, o que não deixa de ser notável para alguém que, ao que tudo indica, nunca teve formação numa universidade. Sendo escudeiro, o que era uma classe de servidores dos nobres, mas que não lhe conferiam esse estatuto, esteve ao serviço dos Condes de Linhares, o que acabou por ser a sua perdição, pelo indisfarçado sentimento pela sua ama, Dª Violante de Andrade. Sendo plebeu e não tendo meios de fortuna, como conseguiria tornar-se culto ao ponto de escrever uma obra tão notável como os Lusíadas? Eu penso que o próprio Camões dá a resposta no Canto X, estância 154, nos "Lusiadas" onde se dirige ao próprio Rei D. Sebastião:

 

Mas eu que falo, humilde, baixo e rudo

de vós não conhecido nem sonhado?

Da boca dos pequenos sei, contudo,

que o louvor sai às vezes acabado.

Nem me falta na vida honesto estudo,

com longa experiência misturado,

nem engenho, que aqui vereis presente,

cousas que juntas se acham raramente

 

Esta estância é completamente esclarecedora e definitiva da condição social e da forma como ele se via a si próprio. Nos dois primeiros versos ficamos a saber que é de baixa condição social e que não frequentava a corte: “de vós não conhecido ou sonhado”. No 3º e 4º reforça a sua baixa condição social e algum sentimento de ingratidão, pelos louvores dados a outros que não terão o seu talento. A estância termina com o auto-elogio. Camões explica como adquiriu o seu conhecimento “nem me falta na vida honesto estudo, com longa experiência misturado”, ou seja a sua escola foi na vida, estudando e aprendendo com a sua experiência. Culmina a estrofe mencionando o seu talento, que associado ao seu trabalho honesto “juntas se acham raramente”. Esta estrofe “despe” completamente Camões dos mitos da sua fidalguia e da sua cultura académica. No entanto, também não comprova a teoria, também muito veiculada, de que tenha morrido na miséria. Para começar, porque entre a data de publicação dos "Lusíadas"(1572) e a morte, a 10 de Junho de 1580, ainda medeiam 8 anos. Está documentado que depois da publicação da sua obra-prima, foi-lhe concedida uma tença, que não sendo nenhuma fortuna, daria algum amparo. Também não está provado que tivesse um criado que lhe pedia esmola para si. Se tivesse assim tão depauperado, podia fazer algo muito mais fácil que seria vender o próprio escravo – o Jau (significa que era natural da ilha de Java).

A biografia de Camões nunca estará completa, mas o poeta também não precisa dela para ser consagrado como o Príncipe das letras portugueses, numa corte onde também têm lugar Fernando Pessoa, Eça de Queirós e o Padre António Vieira.

Neste 10 Junho, viva Portugal. 

publicado por Rui Romão às 00:01
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Sexta-feira, 6 de Abril de 2012

D. Sebastião, o "Desejado" Desde Quando?

Se existe um denominador comum aos dois maiores poetas portugueses, para além do seu talento indiscutível, são os versos encomiásticos que dirigiram a D. Sebastião. Se no caso de Camões isso seria praticamente obrigatório, no caso de Pessoa essa devoção sempre foi um mistério para mim. Os Lusíadas são publicados em 1572, em pleno reinado de D. Sebastião, pelo que é normal que Camões dedicasse a obra ao ilustre descendente daquela gesta ilustre de que nos fala a sua obra-prima. Mas Camões não se ficou pelo elogio, na última estrofe incentiva-o a continuar os feitos notáveis de seu avós, que era, diga-se, voz corrente na altura para fazer face às dificuldades crescentes, que nem sequer poupavam as classes mais privilegiadas. O país estava sedento de um projecto mobilizador e achava-se que a porta de saída do marasmo em que tínhamos mergulhado era a conquista de Marrocos. Para Pessoa, o rei “Encoberto” talvez tenha sido mais uma charneira entre o Império Manuelino do século XVI e o seu imaginário “V Império”, em pleno século XX, forjado nos versos dos poetas. Voltaríamos a ser grandes, a ter o mundo nas mãos, mas num Império espiritual, místico, que começaria com o regresso de D. Sebastião, ponto de inversão desta trajectória descendente que seguíamos desde o seu desaparecimento nas praias marroquinas.

O mito do regresso de D. Sebastião é talvez o fenómeno mais conhecido da História de Portugal, embora por vezes não seja compreendido em toda a sua plenitude. Em primeiro lugar, estaríamos a ser desonestos se atribuíssemos a D. Sebastião a excusiva responsabilidade pela decadência portuguesa, que ninguém discute que teve lugar no final da Iª metade do século XVI, mas que é anterior ao seu reinado. Com D. João III, seu avô, já nos debatíamos com a concorrência que nos moviam os holandeses nos mares da Índia, e faltava um plano estratégico que nos permitisse gerir um Império espalhado por quatro continentes. O único facto positivo, foi o abandono das praças do norte de África, que nunca serviram para nada, para além de ser um sorvedouro de recursos do reino.

Para este cenario sombrio, contribuiu ainda a expulsão dos judeus, grandes senhores da finança, que dominavam o comércio das Índias, e que se acentuou com o estabelecimento da inquisição em 1536. Não é por acaso que ainda hoje dizemos a alguém, quando não queremos que faça algo, para ter cuidado que se pode queimar…

Ao contrário do que se possa pensar, D. Sebastião não foi só “o desejado” depois da sua inglória partida para Alcácer Quibir. Ainda não tinha nascido e já o era, não estivesse o Reino a suspirar por um varão que pudesse suceder ao seu avô, D. João III. Isto porque o seu pai, príncipe D. João, era o único filho homem que podia suceder ao “Piedoso”. Parece que teve sempre uma saúde muito frágil. Ainda o conseguiram casar com uma filha do Imperador Carlos V, mas morreu quando a sua mulher estava grávida deste menino. Deste menino, digo eu agora. Na altura, ninguém sabia se era menino ou menina, até que a criança efectivamente nascesse. Começou aí o epíteto de “O Desejado”, porque o Reino rezava por um varão que pudesse chegar a Rei. As preces divinas foram atendidas e em 1554 nasceu um menino, única vergôntea real. Três anos depois, morre D. João III, e essa criança é o novo Rei de Portugal. A regência é ocupada primeiro pela sua avó, D. Catarina, e mais tarde pelo Cardeal D. Henrique, seu tio-avô, que na altura era Inquisidor Mor e viria a ser o último monarca da Casa de Aviz.

A saúde do novo rei era uma preocupação constante, porque era aquela criança o penhor da independência portuguesa,  e era crucial que pudesse chegar à idade adulta e casar, para dar ao reino descendentes. Voltou a cumprir-se o desejo da nação. O jovem Rei completou 14 anos, idade em que se atingia a maioridade, e começou o seu reinado pessoal. A partir daqui é que a situação se complicou. Não tanto pelos devaneios que lhe povoavam a mente, que outros monarcas não tiveram em menor grau, e que tinham ressonância na sociedade de então, mas pela sua completa aversão a mulheres. Não faltaram tentativas para o casar, mas o Rei nunca manifestou o mais leve indício de querer contrair matrimónio para dar um herdeiro à já velha monarquia fundada por D. Afonso Henriques. E foi sem casar, nem perspectivas disso, que se meteu naquela aventura pelo norte de África que nos colocou praticamente debaixo do jugo espanhol. Não discuto sequer a batalha em si, porque não existem relatos conclusivos sobre o que terá sucedido ao Rei nesse dia 4 de Agosto de 1578.  O que relevo, é que esta data, que podia ser a certdão de óbito do Sebastianismo, acabou por ser um passaporte para a eternidade, com maior populariade em períodos de dificuldade, ou não vivessemos nós também em dias sombrios.   

publicado por Rui Romão às 09:03
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Quarta-feira, 11 de Janeiro de 2012

Longe da Vista, Perto do Coração

Vivemos uma fase particularmente complicada da nossa História. As dificuldades são imensas e não existe qualquer luz ao fundo do túnel. Falta esperança, faltam ideias, faltam causas que nos mobilizem. Cumprir défices não apaixona ninguém. É por isso um tempo propício à reflexão. Pensar porque motivo chegámos aqui e, mais importante ainda, propor algo de novo que nos levante a moral, que nos faça sonhar, que nos catapulte para fora deste abismo. O queixume tornou-se quase uma religião, mas faltam as soluções fora do quadro mental tão em moda nestes dias. Parece que  a única solução para todos os nossos problemas será empobrecermos!

Foi com esta conjuntura em pano de fundo, que no meio de uma reflexão pessoal me ocorreu algo que até aqui nunca me tinha apercebido: os mais lúcidos pensadores, as mentes mais brilhantes que o nosso país gerou, viveram todos, sem excepção, em períodos particularmente difíceis e curiosamente (ou não) passaram largas temporadas no estrangeiro.

Seguindo uma sequência cronológica, lembro-me de Camões, que para além da magnífica obra lírica que nos legou, escreveu o mais comovente documento de exaltação da glória do povo português - Os Lusíadas - e que viveu numa época decadente, com uma inquisição castradora, a carreira das indías ameaçada por holandeses e a independência presa por arames nas mãos de uma criança perturbada (D. Sebastião). Camões andou pela India, por Macau, foi naufrago e regressou à sua pátria, onde lhe concederam uma tença, irregularmente paga, pela publicação do seu monumental épico.

O padre António Vieira, o Imperador da Língua Portuguesa, foi muito novo para o Brasil onde se distinguiu como orador e como defensor dos direitos dos índios, provou estar tão à vontade nas selvas da américa, como nas cortes europeias. Foi escolhido para se deslocar à corte de D. João IV para lhe prestar obediência e terá impressionado tanto o "Restaurador" que este o convidou para usar a sua enorme capacidade oratória na defensa da sua causa nos centros de poder do velho continente. Viveu num período de incerteza em que todo o erário régio era destinado a uma guerra que haveria de durar muito para além da sua vida. A liberdade de pensamento valeu-lhe a inquisição no encalço, principalmente depois da morte do Rei, seu protector. É do padre António Vieira a frase que melhor explica os feitos que este pequeno país à beira-mar plantado logrou alcançar "um palmo de terra para nascer, o mundo inteiro para morrer". Os seus sermões, que se dedicou a passá-los por escrito no fim da vida, são das mais belas páginas jamais escritas em português. 

Eça de Queirós sobraçou a vida diplomática depois de uma curta passagem pelo jornalismo (em Évora) e pelo funcionalismo público (em Leiria), o que o  levou a cidades tão distintas como Havana, Bristol, Newcastle ou Paris, onde passou a maior parte da sua idade adulta. Aí escreveu as suas obras-primas, colocando a nu as fragilidades da sociedade do seu tempo, estiolada pelo anacronismo religioso, pelo caciquismo político e pelo raquitismo mental e cultural.

Contemporâneo de Eça, Fernando Pessoa talvez se tenha cruzado com o autor de "Os Maias" no Chiado da sua infância. Nascido em 1888, precisamente o ano em que Eça publicou a sua obra-prima e que corresponde também ao período mais activo e vibrante dos "Vencidos da Vida", foi para a África do Sul com apenas 7 anos de idade, acompanhando a mãe e o padrasto que tinha sido destacado para a então colónia britânica para exercer um cargo diplomático, regressando apenas em idade adulta (1905) para prosseguir estudos superiores (que nunca concluiu). A glória de Pessoa, como a maioria dos nomes que mencionei (à excepção de Eça), foi póstuma, mas foi o grito mais alto de exaltação do passado português, transposto para o século XX, quando Portugal vivia as páginas mais negras da sua História, mergulhado na anarquia republicana. Trouxe ideias, que era aquilo que então, como hoje, mais necessitávamos. Avançou com a ideia do V Império, que seria um império de poetas, onde Portugal voltaria às suas glórias pretéridas e em que surgiria um novo Camões -que mal consegue disfarçar que seria ele próprio- para as transpor para a mais bela e alta forma de manifestação cultural - a poesia.  

Talvez não tenha sido por acaso que todos eles tenham estado fora da sua pátria. Quando estamos muito perto, não conseguimos ter uma noção de perspectiva. Mas quando estamos muito longe também não conhecemos a realidade em pormenor. Creio que foi essa a grande fonte da sua lucidez, associada ao seu reconhecido génio. Quando existe talento, lucidez, crítica e uma postura construtiva, nós, portugueses, somos capazes de tudo. Faltam-nos causas mobilizadoras, mas que inspiradores podiam ser estes exemplos! 

publicado por Rui Romão às 08:40
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Domingo, 14 de Setembro de 2008

Reconhecer o Mérito

 

Ao passar no Chiado, dois monumentos nos lembram o passado literário daquele local. A estátua, na praça central, do poeta António Ribeiro "Chiado", risonho e com o dedo em riste a apontar para  Fernando Pessoa, sentado na sua Brasileira. Parece querer dizer:  " eu que fui tão pequeno em vida, estou aqui no alto, enquanto tu, que foste tão grande, te vês confinado a um canto".

Não muito longe, para lá da antiga muralha fernandina, jaz a estátua de Camões, inaugurada em 1880 por ocasião do IV centenário da sua morte.

Para além do espaço que a posterioridade lhes reservou, estes três poetas têm em comum o facto de nenhum deles ter conhecido a glória em vida.

Para o poeta Chiado é bastante lisonjeiro ser colocado ao lado destes "monstros" da literatura portuguesa. Poeta mediocre, não fora ter sido associado ao local mais nobre da capital e estaria votado ao mais profundo anonimato. Pouco se saber da sua  vida para além de ter sido um boémio incorrigível, amigo de Camões e viver no Chiado. No entanto hoje em dia coloca-se a questão de saber se foi o poeta que deu nome ao Chiado ou se o Chiado que deu o nome ao poeta. isto porque nos últimos anos foi vingando a tese que o topónimo Chiado seria originário do barulho, vulgo "chiadeira", da principal artéria do país, e como tal o poeta, que se chamava António Ribeiro (Chiado era alcunha),  e vivia no Chiado ter ficado associado ao local.     

Obviamente que Chiado não viu, nem poderia ver, os seus méritos literários reconhecidos em vida. Grandes vultos, como Pessoa e Camões, tiveram igual sorte. No entanto, o seu talento foi descoberto e apreciado pelas gerações vindouras.

Os méritos de Camões começaram a ser descobertos após a restauração da independência. Após 60 anos sob o jugo espanhol, Camões surge como uma referência nacional, em cujos versos se exaltava a valentia portuguesa. A segunda "vaga" camoniana teve lugar em meados do século XIX com o esplendor do romantismo e do orgulho imperial (que teve como consequência o célebre Mapa Côr-de- Rosa).

Fernando Pessoa, por seu turno, teve uma vida que apenas saiu do anonimato com a publicação da "Mensagem", única obra publicada em vida, e da sua actividade como técnico comercial. Quando morreu não poderia imaginar que décadas depois estivesse ao nível de um Camões. Estou convencido que Pessoa, quando morreu, pensaria que em 10 anos ninguém o conheceria. Mas foi preciso esperar por uma nova vaga imperialista, nas vésperas desse grande evento que foi a celebração do duplo centenário da fundação e restauração da nacionalidade, para que se começasse a reparar naquele grande talento. Por ironia, foi o evento organizado por António ferro e apadrinhado pelo regime, que acabariam por elevar a auto-estima nacional e  "abrir terreno" para a consagração de Pessoa, este mesmo que um dia escreveu este poema "dedicado" a Oliveira Salazar:

                                António de Oliveira Salazar

                                Três nomes em sequência regular...

                                António é António

                                Oliveira é uma árvore

                                Salazar é só apelido

                                Até aí está tudo bem

                                O que não faz sentido

                                É o sentido que tudo isso tem 

 

                                     (Fernando Pessoa, citado por Rui Romão)

 

Por falar em reconhecimento, não posso deixar de referir o paladino da mediocridade literária portuguesa, cuja roupagem de heroi carbonario-maçónico lhe garantiu a eternidade no Panteão Nacional, ao lado de algumas das mais importantes figuras portuguesas.

Falo de Guerra Junqueiro, cuja obra literária não mereceria mais do que o Alto de São João, como o comum dos mortais, e a obra cívica não menos que a Cadeia do Limoeiro.

Quando visito Stª Engrácia e vejo o túmulo do autor de "Os Simples", recordo-me, inevitavelmente, do comentário de Felipe II quando passou por Portalegre e vislumbrou um enorme túmulo na Igreja da Conceição (12 mt) que lhe informaram pertencer a um Bispo  "Grande gaiola para tão pequeno pássaro".

publicado por Rui Romão às 18:00
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Segunda-feira, 21 de Julho de 2008

O Povo

 

Quando falamos de Povo, podemos referir-nos a coisas bem diferentes, consoante a perspectiva que se perfilhe. Num sentido jurídico, enquanto elemento do Estado, em sentido político, enquanto Nação (e Portugal é dos poucos casos de Estado-Nação no mundo), em sentido cultural, enquanto comunidade histórica e, finalmente, numa perspectiva social referindo-se à divisão classista da sociedade, onde povo se situa num plano inferior. 

Confesso que o Povo enquanto Nação, ou seja enquanto comunidade cultural, é aquela que mais aprecio, por se tratar de uma perspectiva inter-classista e baseada naquilo que nos une, ao invés daquilo que nos separa. Esta noção comporta, no entanto, uma dimensão jurídica e política, como elemento do Estado, para além do Território e do Poder Político. A diferença é que o Povo poderá não corresponder a uma Nação, existindo mesmo nações que estão divididas entre diversos Estados. A África, desenhada a régua e esquadro após a conferência de Berlim, é um exemplo paradigmático de ambas as situações.

Sendo Portugal um Estado-Nação, curiosamente isso não se sente no dia a dia. Quando nos referimos ao Estado, falamos "deles" não realizando que o Estado somos nós todos. O mesmo não se passa por exemplo nos cidadãos britânicos, que não precisam de Bilhete de Identidade nem sequer de Constituição (em sentido formal), para se referirem ao Estado como "nós". Porventura, esta diferença explica a nossa postura em coisas tão díspares como seja o cumprimentos das nossas obrigações fiscais ou mesmo na falta de valores patrióticos.

O Povo enquanto camada social de base foi descrito, por comparação com a Nobreza e o Clero, por D. João II de uma forma lapidar. Através de uma analogia, o Príncipe Perfeito dizia que os países eram como o mar, onde existem  muitas espécies de peixes diferentes. O salmonete que era muito bom mas raro e caro, enquanto que a sardinha existe em abundância, é saborosa e muito barata... E acrescentava  "Eu sou pela sardinha".

Ele bem sabia do que falava, pela luta que travou com as classes dominantes para atenuar os efeitos das doações de seu pai, que o levou a dizer que "o meu pai só me deixou as estradas do Reino para governar".

O Povo sempre foi o elemento dominante e mais preponderante nos momentos decisivos da nossa História, por absurdo que esta afirmação possa parecer. Quem esteve com o Povo sempre venceu. Assim foi em São Mamede, Ourique, Aljubarrota e guerras da restauração. É certo que o Povo esteve sempre numa situação subalterna, mas sempre que teve um desígnio em que acreditava, sempre levou de vencidas as dificuldades que por vezes não foram pequenas. 

Os maiores cronistas portugueses como  Fernão Lopes, Duarte Galvão, Rui de Pina, João de Barros, etc. tiveram sempre no Povo o seu elemento principal, apesar de não terem poupado na glória de quem os comandava.

Camões chama ao Povo "rude" e "néscio", o que não é de estranhar no seio dos poetas humanistas, que se dirigiam apenas a classes letradas. No entanto, a Nobreza também não é poupada, quando o Príncipe dos Poetas se refere à incultura das classes dominantes, que ainda não tinham "gerado" nenhum Homero ou Virgílio para contar as enormes façanhas da raça lusitana. Como Camões se enganou. Esse grande poeta foi ele próprio. 

 

publicado por Rui Romão às 19:56
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