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Já quase tudo foi escrito sobre os Templários. Desde a sua origem até a sua extinção, por ordem do Papa Clemente V na célebre sexta-feira de 13 de Outubro de 1307, não faltam narrativas científicas, pseudo-científicas e algumas assumidamente ficcionadas sobre os cavaleiros da Ordem do Templo.
Menos conhecida é a sua importância na consolidação da independência portuguesa, no reinado do nosso primeiro Rei, a par com a ordem de Cister. Em ambos os casos, D. Afonso Henriques contou com o forte apoio de Bernard de Clairvaux, mais tarde São Bernardo, cujo influência nestas duas importantes instituições na europa medieval foi decisiva. Recorde-se que no caso da ordem de Cister, derivada da ordem de Cluny, foi concedido o Mosteiro de Alcobaça. Os Cavaleiros do Templo, decisivos na conquista de Lisboa em 1147, foi-lhes oferecida a cidade de Santarém. No entanto, esta cidade era também reclamada pelo Bispo de Lisboa, pelo que, com a intervenção de Gualdim Pais, a ordem acabou por estabelecer-se em Tomar.
Os Templários foram importantes não só na conquista militar do Reino, mas também no reconhecimento papal, onde S. Bernardo foi certamente decisivo, ou não tivesse ele, tal como D. Afonso Henriques, raizes na região de Borgonha.
Com a extinção da ordem decretada pelo Papa, após pressões de Filipe "o Belo", Rei de França, os cavaleiros da Ordem foram ferozmente perseguidos. Provavelmente, o motivo da perseguição foram as elevadas dívidas que a coroa francesa teria contraído junto destes, senhores de uma grande fortuna. A sua extinção foi a solução encontrada, contando com o beneplácito do Papa, que tinha sido eleito com o apoio do monarca francês.
Em Portugal, D. Dinis adoptou uma posição original. Formalmente, extingue-se a Ordem, mas cria-se uma nova com a quase totalidade dos bens e dos cavaleiros do Templo. Esta inteligente solução garantiu a presença dos Templários em Portugal, ainda que com outro nome, e assim nasceu a Ordem de Cristo.
Já escrevi neste mesmo blog, que considero a Ordem de Cristo a primeira multi-nacional do mundo. A missão das descobertas, embora patrocinadas pela coroa, era conduzida pela Ordem, cuja cruz nunca abandonou as velas das naus que percorreram o mundo, e que teve como mestre o Infante D. Henrique.
Recentemente, Paulo Alexandre Loução levantou uma hipótese sobre o espólio dos templários, que creio que não seja dispicienda. Não se trata nem de ouro, nem de prata ou qualquer outra riqueza material, mas sim de documentos que foram encontrados pelos Cavaleiros da Ordem nos locais onde se tinham estabelecido e que foram reunidos num acervo único. Para onde terá ído esse tesouro? Fala-se da Escócia, mas quem nos garante que não tenha vindo para Portugal, onde podiam contar com o Rei que os protegia?
Talvez a epopeia dos Descobrimentos portugueses não tenha sido "mero acaso". Quem sabe se nesse espólio não constavam as viagens de circum navegação do continente africano realizadas pelos fenícios nos séculos VII e VI a.c.? Não terá sido esse o motivo que levou o Rei Lavrador a mandar plantar um pinhal de onde saiu a madeira para as caravelas? Não terá D. Dinis deixado esse legado aos seus sucessores?
Até 1910, o chefe de Estado em Portugal ostentava o título de Rei de Portugal e dos Algarves, D'Áquem e D'Álem Mar em África, etc. Nesse mesmo ano, após o golpe de Estado republicano, foi abolido o Reino de Portugal, mas curiosamente, por lapso, não aboliram o Reino do Algarve, pelo que, presumivelmente, ainda estaria na ordem constitucional actual.
Sendo o Algarve uma provícia assumidamente portuguesa pelo menos desde o reinado de D. Afonso III, porque motivo nunca foi incluído formalmente no Reino de Portugal?
A explicação encontra-se na sua génese. Muitas vezes conquistado e muitas vezes recuperado pelos serracenos, o que é factual é que desde D. Afonso Henriques até D. Afonso III nunca conseguimos dominar pelas armas o Algarve. O caso tornou-se ainda mais grave quando o ultimo rei berbére deixou em testamento esta região ao Rei de castela: Afonso X. Ou seja, o espírito de cruzada que desde sempre animou as conquistas a sul para os cristãos não poderia ser jamais evocado, para além de Afonso X de Castela ser senhor de um poderosíssimo exército.
A somar a estes problemas, Portugal tinha saído de uma guerra civil que opôs D. Sancho II ao futuro D. Afonso III, conde de Bolonha, com a vitória deste último e a sua legitimação pela Santa Sé. A solução para a anexação do Algarve, à boa maneira medieval, foi o casamento de D. Afonso III com uma filha (bastarda) de D. Afonso X, que viria a ser a Raínha Beatriz. Os problemas não se ficaram por aqui porque D. Afonso III já era casado com D. Matilde de Bolonha, estando esta ainda viva. Mais uma vez, o papa foi condescendente com o "Bolonhês" ao conceder-lhe a anulação do casamento com D. Matilde. Assim, o monarca ficou com o caminho aberto para a sua união com D. Beatriz, que se efectivou em 1253, e com este acto definir a fronteira portuguesa a sul.
Com D. Dinis, filho deste consórcio, foi negociado o célebre Tratado de Alcanizes, onde se estipulou a demarcação a leste, que corresponde aproximadamente ao actual mapa de Portugal. Refira-se que a posse do Algarve, à luz do acordo entre Afonso X e D. Afonso III, apenas seria pleno com o nascimento de um herdeiro, que viria a ser D. Dinis.
Um dos mais conceituados historiadores do século XX, Oliveira Marques, considera D. Afonso III o primeiro Rei de Portugal, pelo facto de ter sido o primeiro a conseguir unir a matriz celtico-gotica do norte com a arabo-berbere a sul, que constitui o nosso património cultural e civilizacional há séculos. Se quisermos ser preciosistas, numa posição que pessoalmente não sustento, teríamos que referir, em vez do Bolonhês, D. Dinis como o primeiro rei de Portugal, porquanto que foi o primeiro Rei do Algarve de pleno direito.
Não é meu hábito escrever dois post seguidos sobre a mesma pessoa. Esta minha regra "implícita" apenas cede a excepções quando falo de Eça de Queirós e do homem que deu o seu nome a este blog.
No texto anterior, referi-me à tenacidade de D. Afonso Henriques e aos homens que o ajudaram a forjar este Reino. Confesso que, ao reler o post, fiquei com uma sensação de ingratidão para com o nosso primeiro Rei. Poderei ter sugestionado que D. Afonso era um cruel, anti-semita, "arabofóbico", que não olhava a meios paa atingir os seus fins. O próprio confronto com os exércitos de sua mãe e de Fernão Peres de Trava, e as lendas do encarceramento, poderão dar um retrato que me parece injusto.
É certo que factos são factos, e o que estes nos dizem é que estas batalhas tiveram lugar. Os protagonistas de cada lado também não levantam grandes dúvidas aos historiadores. Difícil, é determinar o lugar, a formação de exércitos, as tácticas utilizadas e as motivações por detrás do conflito.
Para citar dois exemplos, ainda não se sabe ao certo onde teve lugar a batalha de São mamede, embora a opinião, quase unânime, aponte para uma localidade na periferia de Guimarães chamada Creixomil. Quanto à Batalha de Ourique, a situação é mais difícil. A Corte estava em Coimbra, mas o castelo de Leiria tinha sido conquistado pelos cristãos. Como seria possível deslocarem-se até ao Alentejo, em pleno coração Almorávia, numa viagem que se estima em mais de 20 dias sem serem detectados? Por outro lado, caso se tratasse de um fossado (guerra relâmpago com pequeno contingente) teria importância suficiente para contar com a presença de D. Afonso Henriques, que se declarou Rei nessa mesma batalha? São interrogações para as quais não existem respostas definitivas.
Antes de tirarmos conclusões apressadas, convém referir que muita da sua carga mistico-lendária de "matamouros" foi construída à posteriori, tal como a lenda da aparição de Jesus Cristo na Batalha de Ourique (precisamente no dia 25 de Julho, dia de Sant'iago). O que os factos nos demonstram é que D. Afonso Henriques era um homem tolerante. No seu governo, a "pasta" do tesouro era ocupada por um judeu, tendo sempre protegido as populações, inclusivamente na Tomada de Lisboa, onde teve que refrear os ânimos dos Cruzados que o ajudaram nesta empresa. A atestar esta abertura, chegou mesmo a negociar um pacto com Ibn Quasi, um berbere que chefiava um grupo - os Muridinos - que se opôs aos Almorávidas e depois aos Almoadas, chegando a dominar uma parcela significativa do sul peninsular.
No seu selo, que hoje figura nas moedas - a cruz e a rosa - simboliza-se uma dualidade entre a cruxificação, literal como jesus Cristo ou metaforicamente no percuso individual de cada um, e a rosa, sinal de beleza e de um mundo melhor, seja ele terreno ou espiritual. Penso que D. Afonso Henriques acreditava nessa dualidade e com ela viveu uma vida de desafios, mas isso nunca o cegou ao ponto de não compreender a dimensão humana e a importância da vida, seja ela cristã, moçarabe, berbére ou semita.
Já referi várias vezes a particularidade, quase contra-natura, da existência de um país independente na faixa ocidental da Península Ibérica. Fomos os únicos que resistimos à força aglutinadora castelhana e que, não satisfeitos, ainda tivemos força para deixar a nossa marca por esse mundo. Como foi possível a um povo pouco numeroso, num contexto de guerras constantes pela manutenção da sua independência, a capacidade para embarcar nas naus e rasgar esses oceanos em procura de povos para evangelizar e produtos para comerciar? Como escreveu o saudoso Padre António Vieira, "... um palmo de terra para nascer, o mundo inteiro para morrer".
Como foi possível ? É a questão que os historiadores, sociólogos, politólogos e outros sábios têm colocado ao longo dos séculos. Com foi possível a um povo tão pequeno ter sido tão grande? A resposta é simples. Como os homens, também os povos não se medem aos palmos. O legado de bravura que nos foi deixado desde os tempos do nosso primeiro Rei ainda hoje vem à superficie quando é necessário realizar tarefas hérculeas, como seja uma Expo 98 ou um Europeu de Futebol.
É por respeito a esse legado e pelos portugueses que deram a vida para que hoje falássemos a nossa língua, tivessemos os nosos costumes, as nossas tradições, no fundo a nossa identidade. É por isso que não me canso de exaltar os feitos heróicos da nossa gente que tanto nos orgulham e engrandecem.
E como é que isto começou? Os pretensos antepassados dos Portugueses, os lusitanos, que fazem parte do nosso imaginário colectivo, principalmente o valente "Viriato", pouca afinidade têm com o território de Portugal desbravado por D. Afonso Henriques. Ao contrário do que se pensa, não seriam autóctones, mas um povo indoeuropeu que se estabeleceu numa península despovoada. Os Lusitanos foram subjugados pelo Império Romano (após inusitada réplica que muito surprendeu os exércitos romanos) e passaram-se mais de XI séculos, sem qualquer continuidade. Oliveira Martins, que dizia que na Serra da Estrela (precisamente onde, comprovadamente, nasceu e viveu Viriato) vivia o verdadeiro português, por contraste com o celta nortenho ou o serraceno sulista, foi apenas mais um difusor desta teoria. O que é certo é que, após a já referida invasão romana, tivemos as invasões bárbaras, deste os alanos, vândalos, e suevos e mais tarde o dominio visigótico até à tomada da península pelos serracenos do norte de África em 711.
Os próprios príncipes da reconquista, entre os quais o nosso D. Afonso Henriques, eram de origem estrangeira. Nas veias de D. Afonso Henriques corria o sangue do ducado de Borgonha, onde uma população de origem germânica se distinguia pela sua robustez física. Foi essa compleição física e o seu denodo que espalhou o terror pelos seus inimigos e ajudaram a criar um reino que chegou à condição de potência à escala planetária.
Foi a força deste Homem, cujo nome era suficiente para vencer batalhas, e pela sua aura de invencibilidade que grangeara, que nasceu este reino. É certo que D. Afonso Henriques, não o fez sozinho. É da mais elementar justiça citar alguns homens valentes como ele, que hoje seriam facilmente catalogados como gente "pouco recomendáveis". Lembremo-nos pelos nomes como ficaram conhecidos: o "Braganção", o "Sousão", o "Espadeiro", o "Lidador" e o "Geraldo Sem Pavor", entre outros. Mas foram estes homens com a sua valentia que rasgaram este país enos deixaram um legado que nos cumpre respeitar.
Do primeiro para o último rei, ficam as sempre reconfortantes palavras do Rei D. Manuel II, que não obstante o sofrimento imposto por alguns dos seus conterrâneos, sempre dedicou um amor exacerbado pela sua "amada pátria": "sou português e selo-ei sempre. Posso abdicar de todos os meus títulos, menos deste".
Também eu reservo à minha amada Pátria um amor exacerbado. Um amor genuíno, sem pretender nada em troca a não ser o privilégio de ser português. E esse privilégio devo-o a D. Afonso Henriques e à sua horde.
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