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Não conheço muitos detractores do Rei “Venturoso”. A bem dizer, só conheço um, ou melhor dizendo, uma: a historiadora Fina D’Armada, cuja obra obra é notável, sobretudo no estudo do papel das mulheres na epopeia dos descobrimentos, mas que aparentemente não consegue abordar as desgraças que sucederam ao Príncipe Perfeito sem culpar D. Manuel, inclusivamente o desastre de cavalo do Príncipe D. Afonso na Ribeira de Santarém!
Eu não me posso considerar um detractor de D. Manuel, mas também não me considero um deslumbrado pelo seu reinado. Já o escrevi que a este monarca bem se pode aplicar a máxima de Newton “se pude ver mais longe foi porque me pus aos ombros de gigantes”, sendo este gigante o Rei D. João II. Os gloriosos feitos do seu reinado foram todos projectados pelo seu antecessor. A chegada à Índia e ao Brasil foram obra do “Principe Perfeito” que apenas teve a infelicidade de morrer antes de ver o seu sonho concretizado. Vasco da Gama chega à Índia em 1498, apenas 3 anos depois da morte do monarca, não deixando de ser estranho que tenha sido um filho de um governador que estava ao serviço da Ordem de Santiago, cujo Grão-Mestre era o rival de D. Manuel a aceder ao trono, D. Jorge, a executar a façanha. A hipótese que defendo é que o nome terá sido escolhido ainda por D. João II, e que D. Manuel, inteligentemente, não alterou.
É este o mote para falar daquela que foi, na minha opinião, a grande proeza do “Venturoso”. Este Rei soube fazer a charneira entre duas facções que se confrontaram brutalmente nos dois anteriores reinados – as classes senhoriais e os concelhos; i.e. nobreza e clero por um lado e povo por outro.
Esta tensão social já existia desde o começo da nacionalidade, originando disputas violentas, como foram as guerras das infantas com D. Afonso II, a guerra civil entre D. Sancho II e D. Afonso III, e de certo modo entre D. Dinis e D. Afonso IV. D. Manuel chega ao trono, desafiando a teoria da probabilidade, tendo que lidar com um problema criado dois reinados antes, i.e. com D. Afonso V. O “Africano” foi completamente manietado pelas classes priviligiadas, numa onda prodigalizadora que varreu o reino, com claro prejuízo da nação. D. João II sucede a seu pai em 1481 e inicia imediatamente uma resposta brutal para pôr fim a esses abusos, que levou, por exemplo, à extinção da Casa de Bragança, cujo Duque era seu cunhado,à morte do Duque de Viseu (também seu cunhado) do Bispo de Évora, do Alcaíde-Mor de Sesimbra, entre outros.
Numa lógica sequencial, podíamos pensar que D. Manuel, que foi apoiado pelos grandes senhores, começando pela sua irmã, a rainha D.ª Leonor, na luta pela conquista do trono, opondo-se a D. Jorge, representasse o regresso à hegemonia dos nobres. Puro engano. O reinado de D. Manuel não foi uma revanche à política centralizadora de D. João II, mas também não foi um reinado “popular”. Foi uma síntese de ambos, numa atitude clarividente de tentar manter a unidade possível entre as várias classes sociais. Não faltam exemplos dessa política hábil. Para além da nomeação de Vasco da Gama para comandar a armada da Índia, o próprio Afonso de Albuquerque, que era um dos temíveis ginetes de D. João II, foi um grande Vizo-Rei da Índia, também nomeado pelo “Venturoso”.
D. Manuel restaurou a casa de Bragança mas teve a preocupação de manter intocáveis as doações feitas pelo seu antecessor. No caso da casa brigantina, com a sua extinção, D. João II deu Borba, que pertencia a esta casa, a D. Vasco Coutinho, irmão do Alcaide-Mor de Sesimbra e denunciante do atentado que estava em marcha contra D. João II. D. Manuel teve em conta esta doacção, mesmo sendo Vasco Coutinho o responsável pela morte do seu irmão, Dom Diogo, Duque de Viseu, num episódio que já referi em posts anteriores.
Como D. Manuel queria manter intacta a casa de Bragança, deu a D. Vasco a vila do Redondo, por troca com Borba, e assim nasceram os Condes de Redondo. Esta intervenção foi anos mais tarde retribuída pelo então Duque de Bragança, o desiquilibrado D. Jaime, 4º Duque de Bragança, que deu a D. Manuel a Vila da Vidigueira, para que ele pudesse pagar a Vasco da Gama os serviços prestados, depois de lhe ter prometido Sines, a sua terra natal, mas que não pôde concretizar porque esta era pertença da Ordem de Santiago.
Mais do que um rei de epopeia, D. Manuel foi um homem com um elevado sentido de justiça que conseguiu pacificar a sociedade portuguesa, ensaguentada por um confonto de classes que tinha recrudescido nos reinados anteriores, possibilitando a nossa grandeza. Quando os portugueses remam todos para o mesmo lado, mesmo sendo um povo pouco numeroso, até conseguem ser senhores do mundo. Se tivessemos aprendido esta lição de D. Manuel, hoje estaríamos numa situação bem diferente.
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