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Segunda-feira, 17 de Dezembro de 2012

Inês

 

Inês de Castro foi executada em 7 de Janeiro de 1355. D. Dinis morre em 7 de Janeiro de 1325, i.e. exactamente 30 anos antes. Estes dois episódios podiam parecer uma mera coincidência, mas se juntarmos outros factos ganha força a intencionalidade da data. Inês de castro não foi assassinada - no sentido de delito comum – mas sim executada na sequência de uma pena decretada pelas instituições vigentes à época: o Rei D. Afonso, o meirinho-Mor Álvaro Gonçalves (uma espécie de ministro da Justiça) e os seus conselheiros Diogo Lopes Pacheco e Pero Coelho. Ou seja, a pena foi decretada e executada numa data escolhida pelo Rei. Porque motivo D. Afonso IV escolheu esta data? Certamente não a ignorara. Creio que foi uma vingança relativamente a seu pai e a seu irmão bastardo. Relembremos que D. Afonso IV moveu uma guerra ao seu pai porque entendia que este ao nomear Afonso Sanches, seu meio-irmão, mordomo-mor (primeiro ministro, na designação actual) estava a entregar-lhe o poder e a facilitar o seu caminho para lhe suceder no trono, em detrimento de D. Afonso IV, que era o único filho legítimo. Esta guerra acabou com a vitória de D. Afonso IV, mantendo-se Dom Dinis no poder até à morte mas numa função quase simbólica. E Inês, porquê? Inês de Castro foi criada em Albuquerque (Castela), precisamente no local onde se fixou Afonso Sanches após a guerra entre seu pai e meio-irmão. Em Albuquerque ele e a sua mulher Dª. Teresa Sanches foram uma espécie de pais adoptivos desta fidalga (por via de 2 bastardias). Foi em Albuquerque que Inês de Castro se fixou, por exemplo, quando D. Afonso IV a expulsou na sequência da visibilidade dos seus amores com Pedro. O problema não era o Infante ter amantes (todos as devem ter tido) mas geralmente eram de condição maia baixa. Com a morte da Rainha Dona Constança, Pedro mandou regressar Inês, vivendo com ela primeiro no Paço de Moledo e mais tarde num anexo do Convento de Santa Clara, local onde os executores a degolaram. Para esta teoria contribui outro facto. Em Castela da-se um levantamento contra o Rei Pedro “o Cruel” onde estão envolvidos vários fidalgos castelhanos, entre os quais os irmãos de Inês de Castro, os filhos bastardos do rei Afonso XI (que dariam lugar á dinastia de Trâstamara), e o filho de Afonso Sanches, o célebre João Manuel “do Ataúde” (ataúde era um caixão, e as teorias para este epíteto são muitas e pouco convincentes). Através de Inês de Castro, os irmãos Castro (este apelido parece destinado ao plural) tentaram seduzir o Príncipe Português para o seu partido, e este, ingenuamente, sentiu-se tentado a aderir, confiando que lhe entregariam a coroa de Castela de mão-beijada. Bem sizudo foi D. Afonso IV em não querer meter-se num assunto que nunca traria nada de bom para Portugal. Só nos meteria numa guerra sem proveito, como faria o neto de Afonso IV, Dom Fernando. Nesse sentido, Dom Afonso IV, não hesitou. O melhor, do ponto de vista pragmático, era matar o Príncipe. Mas como era seu filho e único sucessor, a única forma era matar Inês de Castro, castigando ao mesmo tempo o seu irmão bastardo, o seu sobrinho (cabecilha da revolta) e o seu pai, Dom Dinis. É errado dizer que foi por o Príncipe querer casar com Inês que o Rei a mandou executar. Várias fontes da época, como Fernão Lopes, Rui de Pina e o próprio Diogo Lopes Pacheco (um dos executores de Inês), referem-no, que o Rei D. Afonso IV questionara o filho se ele casou ou fazia tenção de o fazer, para que se pudesse dar o tratamento devido a Inês de Castro. O Príncipe sempre negou que tinha casado e disse-o que nunca o faria. Apenas 3 anos após subir ao trono é que o afirmou solenemente em Cantanhede e em Coimbra. Mas nem se lembra do dia nem da data, nem sequer o Bispo que supostamente os casou em Bragança – D. Gil. Apenas um seu privado, Estevão Lobato, avançou com uma data, imagine-se, o 1º de Janeiro. Como seria possível, caso se tivessem efectivamente casado, esquecer esta data, e ainda por cima numa data tão facil de memorizar. E porque motivo apenas o afirma 3 anos após ser Rei? A teoria do medo da reacção de D. Afonso IV não convence, porque este já não estava no mundo dos vivos. A questão do beija-mão e da coroação após a morte é mais uma lenda. Como é que se poderia coroar uma mulher a quem tinham arrancado a cabeça com um machado? E colocavam-na num trono sem a cabeça para lhe beijarem a mão? Nenhuma fonte da época o refere, nem sequer Camões. Acredita-se, por acaso, se este episódio fosse conhecido à época de Camões, que este perderia o ensejo para o colocar nos “Lusíadas”, onde dá grande destaque ao episódio? Mais uma lenda criada pelos autores românticos do século XVIII. Para concluir e em súmula, creio que o episódio de Inês de Castro foi uma vingança de D. Afonso IV relativamente ao seu pai e seu irmão bastardo, motivada por um cenário real de perigo para Portugal. Com a morte de Inês de castro D. Afonso IV conseguia atingir 2 objectivos: Vingança de quem o tentou afastar do trono (na sua perspectiva, claro) e paz no Reino. Não esperava talvez a reação do infante, que tentou assenhoriar-se do Porto (não seria o últimoRei com este nome a fazê-lo num contexto de guerra civil) Dom Pedro fixa-se em Canavezes onde selou a paz com o pai, na presença do Arcebispom de Braga. Não cumpriu com as disposições que jurou sobre os evangelhos, pelo menos no tocante à amenistia dos executores de Inês. Quando o Rei. Dom Afonso IV já agonizava os executores, desconfiados das intenções do Infante, fugiram para Castela, pensando que lá estariam em segurança. Enganaram-se. Numa troca de prisioneiros com o seu sobrinho, também Pedro e também cruel, Alvaro Gonçalves e Pero Coelho foram entregues à sua justiça, mandando-lhe arrancar o coração ainda vivos. Um pelas costas e outro pelo peito. Lopes Pacheco, por sorte e pela ajuda de um pastor – assim nos conta Fernão Lopes - conseguiu fugir para Aragão voltando mais tarde ao Reino por amenistia do Rei. Ao revisitar o tema da morte de Inês de Castro estou a entrar em contradição com aquilo que penso que foi a importância deste episódio na nossa História: nenhuma. Pode-se questionar esta teoria com base na reacção violenta do Príncipe, nos túmulos reais - talvez mais belos que tivemos em toda a nossa História - mas em termos daquilo que foi a nossa trajectória como povo, este episódio está claramente inflacionado. Contudo, este drama, em grande parte impulsionado por Camões e pelos literatos românticos, continua a fascinar-nos e eu não fico imune ao seu poder sedutor. Acontece que à medida que o tempo vai passando, vou lendo mais sobre o assunto e reflectindo sobre o emaranhado de factos que originaram este episódio, e creio que neste momento cheguei uma teoria definitiva (para mim, claro) sobre a morte de Inês de Castro.

publicado por Rui Romão às 09:49
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Quinta-feira, 9 de Setembro de 2010

Mais Prosa do que Poesia na Vida de D. Pedro.

 

 

 

Estive por estes dias em Alcobaça e nem queria acreditar quando constatei que junto dos célebres túmulos de D. Pedro e D. Inês de Castro existe um erro na data do reinado daquele que ficou conhecido como "o justiceiro".  Em vez de 1360, deveria ler-se 1357, ano da morte de seu pai - D. Afonso IV -  e seu antecessor. Tanto mais que à data, D. Pedro já era viúvo daquela que foi indiscutivelmente sua mulher: D. Constança Manuel.

Parece que a historiografia se tem inspirado na veia poética do avô de D. Pedro (D. Dinis) e esquecido a parte mais factual. O erro na datação do túmulo é a metáfora perfeita daquilo que tem sido a visão romanceada da sua vida, envolta quase exclusivamente na relação com Inês de Castro.

Vamos aos factos. Para começar, nunca se escreve sobre a sua inclinação homossexual. Nisso, Fernão Lopes é mais corajoso do que muito autor contemporâneo, embora este fosse cronista de D. João I - que disputou o trono com os filhos de D. Pedro e D. Inês - no entanto merece todo o crédito por ser um escritor honesto. Conta-nos na crónica de D. Pedro, com a sua habitual mestria, do amor entre o Rei e o escudeiro Afonso Madeira "e como quer que o el rei muito amasse, mais de que se deve aqui dizer (...). O escudeiro não teve uma história feliz para contar. Envolveu-se com uma mulher casada e num rebate ciumento, D. Pedro não foi misericordioso, assim como não foi com os carrascos de Inês de Castro, e ainda segundo a pena de Fernão Lopes, "mandou-lhe cortar aqueles membros que os homens em mor apreço têm". 

A própria história de Inês de Castro está muito mal contada, a bem da poesia mas em detrimento da verdade. Prosaicamente, se D. Pedro não casou com D. Inês foi porque não quis. D. Afonso IV instou-o a fazê-lo mas ele sempre se recusou, preferindo viver  "amancebado", usando a terminologia da época, sem garantir a sucessão ao trono, que apenas se sustentava numa criança débil, o futuro D. Fernando I, o tal "Rei fraco que faz fraca a forte gente" segundo a pena corrosiva de Camões.

Para além da questão sucessória, que impedia que celebrasse casamento, gerava uma situação indefinida porque o rei ia "coleccionando" bastardos numa situação que não se podia considerar nem de casamento nem de uma simples e habitual situação cortesã.

A somar a isto tudo, a perniciosa influência dos irmãos de Inês de Castro, que nos podia custar a independência pelo seu envolvimento na fratricida guerra castelhana entre Pedro "O Cruel" e Henrique de Trastâmara.

Isto não justifica que se retire a vida a alguém, mas também não se pode dizer que D. Afonso IV agia apenas por uma questão passional ou por requintes de malvadez. Foram razões de Estado que presidiram a esta decisão.

A História é a História, não a podemos mudar. Mas no presente, bem que se podia mudar a placa...   

 

publicado por Rui Romão às 22:13
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