Imbuído pela onda de euforia em torno dos E.U.A, decorrente da eleição de Barack Obama, cruzei-me novamente com Alexis de Tocqueville e a sua célebre obra sobre a democraia norte-americana, "Da Democracia na América".
Tocqueville viveu na primeira metade do século XIX, numa França devastada pelas guerras napoleónicas. Desde cedo apercebeu-se do abismo que separavam os ideais da Revolução Francesa e a sua tradução na realidade efectiva do país. Foi de um país cheio de contradições que em 1831 o jovem Alexis parte rumo aos Estados da América do Norte, a pretexto do estudo do seu sistema penintenciário. No entanto, a estadia foi aproveitada para estudar o sistema político do país, que considerava o modelo democrático de então. O mérito do seu trabalho foi amplamente reconhecido, a que não faltaram comparações com Montesquieu, pelo facto de Alexis de Tocquvile ter trazido para o velho continente o conhecimento da então jovem democracia americana. O seu êxito explica-se pelo facto de não se ter contentado com abstrações ou generalidades, perfeitamente ao alcance do senso comum, mas antes foi ao fundo da realidade americana, oferecendo uma abordagem simultaneamente política, social, económica e cultural.
No entanto, o que me retém neste post é um parágrafo de Alexis de Tocqueville, que na minha opinião explica a diferença entre as boas e a más democracias, para não falar das ditaduras (que caracterizam a maioria dos regimes à escala mundial) e que são necessariamente piores do que as más democracias.
E essa diferença explica-se pela incapacidade do povo em tomar parte de uma forma plena na coisa pública. Como escreveu Alexis de Tocqueville:"A grosseria dos homens do povo (...) não vem somente de serem ignorantes e pobres, mas de, sendo-o, estarem diariamente em contacto com homens esclarecidos e ricos. A visão do seu infortúnio e da sua fraqueza, que vem todos os dias contrastar com a felicidade e poderio de alguns dos seus semelhantes, excita no seu coração ao mesmo tempo cólera e temor, o sentimento da sua inferioridade e da sua dependência irrita-os e humilha-os. Este estado interior da sua alma reproduz-se nos seus costumes, bem como na sua linguagem, são simultaneamente insolentes e baixos".
Este retrato explica a razão pela qual até para os liberais mais acérrimos da escola de Adam Smith ( que após esta crise estarão um pouco menos liberais) defendem que a educação dever ser uma prioridade do Estado por forma a garantir à partida a igualdade de oportunidades a todos os cidadãos.
No entanto, como não existe esta igualdade porque o sistema de ensino é mediocre e não consegue reter os jovens na escola, estas desigualdades vão-se amplificando e levam a que a maioria dos cidadãos não possa exercer plenamente os seus direitos.
Reconheço que este raciocínio é perigoso. Foi, por exemplo, a reflexão de Oliveira Salazar, ao admitir que a Democracia (onde o poder brota da maioria) não poderia vingar num país onde a maioria do povo é analfabeto. É evidente que este raciocínio lhe era conveniente, mas infelizmente existe algum substracto de verdade.
Na Democracia o poder reside no povo, que o pode exercer directamente ou através da eleição dos seus representantes.Se o povo é iletrado nunca poderá exercer este poder na sua plenitude. Como dizia Paulo Teixeira Pinto, em Portugal fala-se de muito do que não se sabe. E acrescento, discutem-se pouco os assuntos que nos dizem directamente respeito, e dos quais deveríamos ter posições assumidas.
No entanto não deve ser ao Povo que devem ser assacadas responsabilidades, mas sim aos sucessivos poderes públicos que não obstante as suas célebres "paixões" nunca conseguiram tornar o sistema de ensino eficaz.
Enquanto tivermos níveis de escolaridade tão baixos, continuará a prevalecer o raciocínio básico, pejado de opiniões e soluções milagrosa para resolver todos os assuntos que "eles" (essa entidade abstracta que é o Estado, como se o Povo também não fizesse parte do Estado) criaram, mas que no fundo não é mais do que o espelho da ignorância.
Em Portugal só teremos uma democracia plena quando a educação estiver igualmente no plano democrático, o que, temo, estará num horizonte longínquo.
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