Até 1910, o chefe de Estado em Portugal ostentava o título de Rei de Portugal e dos Algarves, D'Áquem e D'Álem Mar em África, etc. Nesse mesmo ano, após o golpe de Estado republicano, foi abolido o Reino de Portugal, mas curiosamente, por lapso, não aboliram o Reino do Algarve, pelo que, presumivelmente, ainda estaria na ordem constitucional actual.
Sendo o Algarve uma provícia assumidamente portuguesa pelo menos desde o reinado de D. Afonso III, porque motivo nunca foi incluído formalmente no Reino de Portugal?
A explicação encontra-se na sua génese. Muitas vezes conquistado e muitas vezes recuperado pelos serracenos, o que é factual é que desde D. Afonso Henriques até D. Afonso III nunca conseguimos dominar pelas armas o Algarve. O caso tornou-se ainda mais grave quando o ultimo rei berbére deixou em testamento esta região ao Rei de castela: Afonso X. Ou seja, o espírito de cruzada que desde sempre animou as conquistas a sul para os cristãos não poderia ser jamais evocado, para além de Afonso X de Castela ser senhor de um poderosíssimo exército.
A somar a estes problemas, Portugal tinha saído de uma guerra civil que opôs D. Sancho II ao futuro D. Afonso III, conde de Bolonha, com a vitória deste último e a sua legitimação pela Santa Sé. A solução para a anexação do Algarve, à boa maneira medieval, foi o casamento de D. Afonso III com uma filha (bastarda) de D. Afonso X, que viria a ser a Raínha Beatriz. Os problemas não se ficaram por aqui porque D. Afonso III já era casado com D. Matilde de Bolonha, estando esta ainda viva. Mais uma vez, o papa foi condescendente com o "Bolonhês" ao conceder-lhe a anulação do casamento com D. Matilde. Assim, o monarca ficou com o caminho aberto para a sua união com D. Beatriz, que se efectivou em 1253, e com este acto definir a fronteira portuguesa a sul.
Com D. Dinis, filho deste consórcio, foi negociado o célebre Tratado de Alcanizes, onde se estipulou a demarcação a leste, que corresponde aproximadamente ao actual mapa de Portugal. Refira-se que a posse do Algarve, à luz do acordo entre Afonso X e D. Afonso III, apenas seria pleno com o nascimento de um herdeiro, que viria a ser D. Dinis.
Um dos mais conceituados historiadores do século XX, Oliveira Marques, considera D. Afonso III o primeiro Rei de Portugal, pelo facto de ter sido o primeiro a conseguir unir a matriz celtico-gotica do norte com a arabo-berbere a sul, que constitui o nosso património cultural e civilizacional há séculos. Se quisermos ser preciosistas, numa posição que pessoalmente não sustento, teríamos que referir, em vez do Bolonhês, D. Dinis como o primeiro rei de Portugal, porquanto que foi o primeiro Rei do Algarve de pleno direito.
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