Dizia Manuel Alegre, na sequência da visita do presidente de Angola a Portugal, que D. Afonso Henriques também não era um "democrata exemplar". Ou se tratou de um momento menos feliz do deputado-poeta ou então, mais grave, esta afirmação revela uma total ignorância histórica, que muito sinceramente não julgava possível em alguém com o seu percurso. Comparar a vida e o projecto de um homem que construiu um país com base em princípios éticos e morais inatacáveis como foi o caso do nosso primeiro rei, com um ditador que prospera há 30 anos numa opulência obscena, perante o olhar impávido e faminto de um povo é, no mínimo, patético.
Porventura Alegre gostaria que D. Afonso Henriques tivesse instituído o parlamentarismo em 1147 quando tomou Lisboa. Que tivesse promovido o recenseamento da população, marcasse eleições para uma assembleia constituinte, por circulos plurinominais e com eleição segundo o método de Hondt. Que se tenha submetido aos representantes do povo, que lhe atribuiram os poderes e competências conforme a constituição. Que tenha construído tribunais de primeira e segunda instância, Imprensa livre, fomentasse o aparecimento de partidos políticos e desse condições à oposição.
Manuel Alegre, estamos no século XII. O parlamentarismo nasceu em 1688 com a Glorious Revolution e em Portugal chegou no século XIX. O Estado moderno, do ponto de vista funcional é uma herança da revolução francesa (Napoleão costumava dizer que não seria lembrado pela batalhas que ganhou mas pelo seu código civil), e teve vários estágios até chegar ao modelo que vigora nas democracias actuais.
Comparar estes tempos com Angola no século XXI é um perfeito dislate. Um país riquíssimo em matérias primas, com um território que equivale a mais de 14 vezes o de Portugal, mas que tem a má sorte de ser governado por uma elite de criminosos (Richard Branson dixit). No poder há 30 anos, o legado de Eduardo dos Santos resume-se a uma corrupção generalizada, condições precárias das populações com escassez de alimentos e de condições higienico-sanitárias. Num país onde faltam hospitais, escolas, locais de lazer e cultura, sobra pouca-vergonha, da qual os políticos portugueses foram cúmplices na recente visita de Eduardo dos Santos.
Se é este o modelo de político de Manuel Alegre, o melhor dos poetas "assim assim" segundo as palavras de Agustina, porventura secundado por outros idealizados por grandes "democratas" na linha de um Robespierre ou de um Afonso Costa, então é caso para dizer que bem mereceu a derrota que o povo português lhe deu nas urnas.
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