Há uns dias atrás fiz uma visita ao Mosteiro de São Dinis, mais conhecido simplesmente como de "Odivelas". Foi uma visita guiada, que tem lugar no 1º e 3º fim-de-semana de cada mês, e cuja iniciativa se deve a um protocolo entre a Câmara Municipal e o Ministério da Defesa, que está actualmente na posse do edifício. Foi uma visita muito interessante onde pude ver pela primeira vez o túmulo de Dom Dinis, ver um orgão feito pelo pai de Machado de Castro (que era mestre organista) e ainda o que resta da parte primitiva do mosteiro que resistiu ao terramoto de 1755. No entanto, o que mais me surpreendeu, foi logo na entrada do mosteiro ver o busto do Infante Dom Afonso Henriques, fundador do Instituto de Odivelas corria o ano da morte de Eça (1900).
A supresa deve-se ao facto de eu desconhecer por completo que tinha sido o infante o fundador do dito instituto e também porque não conheço outra representação do filho cadete de D. Luis e Dª Maria Pia, sendo talvez das figuras do início do século XX mais desconhecidas da História portuguesa.
D. Afonso Henriques ficou conhecido como o "arreda" porque foi umas das primeiras pessoas em Portugal a ter automóvel, numa altura em que os caminhos (não se podiam chamar estradas) não estavam preparados para receber estes novos veículos. Em vias desenhadas para carros de bois e cavalos, sobressaia o automóvel do Infante que, como devem calcular, não teria muita facilidade de passagem para a velocidade, na altura, supersónica que podia chegar aos 40 kms. hora. Assim, para facilitar a sua mobilidade, D. Afonso Henriques utilizava a sua voz como sinal de passagem, gritando constantemente "arreda!", para conseguir desempedir a via.
De resto este infante gozou sempre de uma grande popularidade, pela fama de tonto que cultivou ao longo da sua vida. Era também comandante dos Bombeiros Voluntários da Ajuda, e não raras vezes era visto em acções de socorro. Contudo, esta vida pitoresca terminou subitamente em 1908 com o regicídio. O Infante era uma das personalidades que esperava a família real no cais do Terreiro do Paço no dia 1 de Fevereiro, ao lado do seu sobrinho D. Manuel (que mal sabia que estava a escassos minutos de se tornar Rei), acompanhando a comitiva no seu automóvel nessa curta viagem que terminou tragicamente na esquina da Rua do Arsenal. Nessa viagem Dom Carlos e D. Luis Filipe foram barbaramente assassinados e não fosse a fortuna (ou má pontaria)de o tiro que acertou em D. Manuel apenas lhe tivesse atingido num braço e o "Arreda" teria deixado nesse dia de ser o bem-disposto infante para ser aclamado D. Afonso VII, Rei de Portugal e dos Algarves D'Áquem e D'Álem Mar em África. Nesse dia Dom Afonso mostrou a sua fibra, tendo sido dos primeiros a apear-se do seu automóvel para acudir à família real que se fazia transportar num landau aberto. Quem sabe se pela sua experiência como bombeiro, mostrou ser um Homem de uma grande coragem e sangue frio.
Jurado herdeiro presuntivo do trono, o Duque do Porto (de que era titular) foi forçado a partir na Ericeira para o exílio no dia 5 de Outubro de 1910. Acompanhou a mãe, Dª Maria Pia (que morreria poucos meses depois), e fixou residência em Itália. Teria continuado a ter uma vida pacata não fosse ter casado com uma cidadã americana de nome Nevada Stoods, que era conhecida como uma espécie de caçadora de fortunas e que pretendia certamente tirar algum benefício desse matrimónio. O Rei Dom Manuel II não deu o seu aval ao casamento (terão mesmo cortado relações) e o infante acabou por casar morganaticamente em Madrid no ano de 1917. É conhecido o embaraço do embaixador português na capital espanhola quanto à forma de tratamento de um membro da família real no exílio. Optou por trata-lo por "Sua Alteza" sem mencionar o "Real".
Morreu em 1920 e foi o primeiro Bragança a regressar do exílio para o panteão de São Vicente de Fora. A Americana, que numa foto conhecida parecia mais interessada na pose do que em carpir a mágoa pelo desaparecimento do marido, reivindicou metade do recheio do palácio da Ajuda. A sua herança, felizmente, foi bastante mais modesta.
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