Há vários anos que me interrogo acerca do motivo pelo qual não existe no nosso país um espaço dedicado às principais marcas que o povo português legou à humanidade:
-A língua portuguesa
-Os descobrimentos marítimos
Se no caso da língua portuguesa, o Brasil se encarregou de legar à lusofonia o "Museu da Língua Portuguesa" (caso paradigmático), no que respeita aos descobrimentos não existe qualquer evocação dessa grande empresa que mudou indelevel e permanentemente a História da humanidade.
Se a ausência nas nossas ex-colónias é normal e compreensível, por ser difícil fugir à glorificação do conquistador, não o será em território nacional. Volvidos mais de 500 anos do início desta epopeia, nunca se reuniu um espólio que pudesse contar não só às próximas gerações como aos turistas que nos visitam o maior feito da nossa História e um dos mais marcantes da História universal.
No que respeita a turismo, se a aposta passa por um turismo de qualidade, dirigido a um público com interesse cultural e geralmente com maior poder de compra, não sei como os agentes turísticos justificam esta pecha. Talvez o nosso turismo não tenha vocação para além do sol e praia, no entanto fica o lamento pelo discurso político incoerente.
Pessoalmente, devo fazer um "mea culpa" pelo pouco que tenho escrito sobre a presença portuguesa por esse "salso argento". Quando o fiz, fi-lo em termos pouco elogiosos para Vasco da Gama, o capitão dos mares da Índia (vide Vasco da Gama e Seus Mitos; 16-10-2006).
Consola-me a alma, saber que Camões fez o mesmo. Não raras vezes, o Grande Poeta, que ainda era familiar de Vasco da Gama, retratou o Capitão da armada portuguesa como um ingénuo, inábil e até timorato. Em II, 6, nos últimos dois versos, põe a descoberto a sua ingenuidade a propósito da cilada preparada pelo Rei de Mombaça, ao arrepio das fontes históricas:
Por onde o Capitão seguramente
Se fia da infiel e falsa gente
Por seu turno, não poupa elogios a Duarte Pacheco Pereira, a quem chama de "Aquiles Lusitano", sublinhando as injustiças que sofreu ao longo da sua vida, nomeadamente um prémio (presumivelmente São Jorge da Mina) em que foi preterido face a Brás de Albuquerque, filho de Afonso de Albuquerque, e arqui-inimigo de Camões (X, 24).
Isto fazem os Reis, quando embebidos
Numa aparência branda que os contenta;
Dão os Prémios, de Aiace merecidos,
À língua vâ de Ulisses fraudulenta.
Mas vingo-me: que os bens mal repartidos
Por quem só doces sombras apresenta,
Se não os dão a sábios cavaleiros,
Dão-os logo a avarentos lisonjeiros.
O grande arquitecto das descobertas, o Infante D. Henrique, não teve melhor sorte. Camões pouca atenção lhe dedica, contabilizando-se apenas um verso no grande poema camoniano. Como sublinha António Cândido, nunca nenhuma lenda o envolveu numa esfera metafísica, que o transportasse para a galeria dos heróis, à semelhança de outros, cujos méritos não são comparáveis ao mais célebre membro da "Ínclita Geração".
Não deixa de ser verdade que os coevos o descreveram como crudelíssimo, homossexual, venal e interesseiro. Também não será faltar à verdade dizer que não existem grandes façanhas que excitem o imaginário popular. Nunca participou em nenhuma batalha, nunca comandou uma armada, nunca cometeu nenhuma proeza heróica. Foi racional e, como nós sabemos, os racionalistas nunca foram bem amados entre nós.
Quanto à minha contribuição para a divulgação destes desígnios, cumpro-o, em parte, com este blog. Abordo questões da nossa História (embora nem sempre referente às descobertas) e escrevo em Português!
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