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Quarta-feira, 11 de Abril de 2012

A Popularidade das Ultimas Rainhas de Portugal

As das rainhas a que me refiro no título são nem mais nem menos do que a última e a penúltima rainha de Portugal. Uma Italiana, outra francesa, mas ambas deixaram uma marca indelével na sociedade portuguesa da segunda metade do Século XIX e no início do século XX. No entanto, não podiam ser mais diferentes.

Dona Maria Pia era uma rainha perdulária, que não se coibia a gastos exacerbados na toilette, de pose senhorial, muito segura de si, mas com um temperamento impulsivo, que chegava a parecer mais uma cezarina do que uma rainha consorte. São históricas as palavras que dirigiu ao velho Duque de Saldanha, quando este cercou o Paço da Ajuda para intimar o Rei a demitir o ministério do seu arqui-rival Duque de Loulé, num golpe que ficou conhecido como a “Saldanhada”. Quando o velho lobo do Liberalismo foi apresentar, como era costume, os cumprimentos à Rainha, esta disse-lhe que se fosse ela o Rei, tê-lo-ia mandado fuzilar…

A prodigalidade da rainha foi sempre sustentada pela “boa vontade” de alguns argentários que então já prosperavam com o fomento do fontismo, com destaque para o Conde de Burnay, fundador, entre muitas outras empresas, da CUF, e cujo título se fica a dever aos sucessivos empréstimos que fazia à Rainha, nomeadamente para pagar os vestidos que usava uma única vez e depois doava ao Teatro São Carlos, para fazer parte do guarda-roupa dos espectáculos. Seria injusto não mencionar também a obra de caridade de Dona Maria Pia, na fundação de creches e no auxílio às vítimas de catástrofes.

Dona Amélia de Orleães, Princesa de França, Rainha de Portugal, bem podia ser caracterizada como o oposto da sua antecessora, não fosse ter sido também uma autêntica matriarca da caridade. Do seu legado fica a fundação das cozinhas económicas, o Instituto de Socorros a náufragos, o dispensário de Alcântara, entre outras obras de cariz cultural, como por exemplo a fundação do Museu dos Coches, que é ainda hoje, por larga margem, o mais visitado museu português.

A História de Dona Amélia não foi feliz. Casou-se em 1886 com D. Carlos, então Duque de Bragança, mas desse casamento só guarda más memórias. O Rei era conhecido pela fama de mulherengo, o que encheu de amargura o coração desta rainha que era, por influência literária, uma romântica, e que via os seus sonhos de um casamento feliz esbarrarem na frieza de um marido que via no consórcio um acto meramente político. Também D. Maria Pia sabia das aventuras do seu marido, D. Luís, reagindo com alguma virulência, mas que aparentemente não a mergulhavam na melancolia.

Este drama de Dª Amélia foi só o primeiro, e quem sabe o menos dramático enfrentou na sua vida. Assim que casou, a cidade de Paris quis homenageá-la, oferecendo-lhe uma réplica de prata de uma caravela portuguesa. Essa onda de entusiasmo que se fez sentir em França, levou ao exílio do seu pai, D. Luís Filipe, Conde de Paris, então pretendente ao trono pela linha da casa de Orleães.

Um ano depois, em 1887, deu à luz uma menina, Dona Mariana, que não resistiu muito tempo fora do ventre materno. Tinha então já um menino, D. Luís Filipe, nascido nesse mesmo ano, e D. Manuel, que viria a ser o último rei de Portugal, e que nasceu em Novembro de 1889, quando o seu pai era Rei há cerca de 1 mês.

De todos os dramas que viveu, o maior foi sem dúvida o que teve lugar no dia 1 de Fevereiro de 1908, quando o seu marido e o filho primogénito são assassinados em pleno Terreiro do Paço, sendo épica a sua atitude ao enfrentar os criminosos com um ramo de flores que lhe tinham dado quando desembarcou no Cais das Colunas. Esse drama marcou-a para sempre, embora lhe tenha dado a oportunidade, que talvez gostasse de ter noutras circunstâncias, para ser praticamente uma regente e ter o protagonismo político que o seu marido sempre lhe negou. Em Fevereiro de 1908 D. Manuel II era um jovem de 18 anos que se preparava para entrar para o curso de oficiais de Marinha, pelo que não tinha qualquer noção do trabalho que o esperava. Nessa situação difícil, a rainha mostrou a sua coragem e assumiu praticamente a condução dos destinos do país, o que lhe grangeou ódios de estimação, já antigos no seio dos republicanos.

Em 1910 veio o exílio, que ela conhecia tão bem, não fosse ela filha de um pretendente ao trono, que teve que sair de França porque a filha seria um dia rainha.

Mas porque motivo D. Maria Pia, perdulária, esbanjadora, de feitio sanguíneo, que terá dito um dia “que quem quer rainhas paga-as”, era imensamente popular até pelos republicanos (só ultrapassada pelo seu filho, Infante D. Afonso, que tinha fama de tonto) ao passo que a discreta Dª Amélia, que nunca manifestou qualquer sinal exterior de riqueza ou ostentação e que se dedicou à caridade toda a vida, era vilipendiada e odiada, principalmente pelas forças mais progressistas. A exacerbação era tanta que Eça de Queiroz foi imensamente criticado por ter escrito umas linhas elogiosas para com a Rainha…

É este o mote que justifica o título do post. Na minha opinião, a resposta está, nem mais nem menos, na História europeia do século XIX, nomeadamente na fase pós revolução francesa. Esquisito? Talvez. Mas vejamos a ascendência de ambas as soberanas, porque creio que foram estas famílias, com um papel relevantíssimo na França e na Itália pós napoleónica, que se encontra a chave para esse enigma neste nosso burgo lusitano.

Comecemos por Dª Maria Pia. Filha de Vítor Emanuel II, Rei da Sardenha e do Piemonte, foi o primeiro Rei de Itália. A Península Italiana no século XIX era um conjunto de Estados relativamente Independentes sem qualquer unidade política, dos quais se destacavam a Sardenha (a norte), os Estados Pontifícios (ao centro), e o Reino das Duas Sicilias (a sul), para além dos pequenos ducados. Digo que alguns apenas eram relativamente independentes, porque desde há muito que a influência austríaca, por força da política de consórcios, se fazia sentir. Foi precisamente por ai que se trilhou o caminho da Independência, começando por combater os Austríacos que ainda dominavam largas parcelas do território a norte, como Veneza e a Lombardia. Nos primórdios, essa guerra não correu bem, levando ao exílio do Rei Carlos Alberto, avô da Rainha Dª Maria Pia, que veio morrer no Porto, depois da derrota na batalha de Novara.

O seu filho, Vítor Emanuel II, aliando-se à França de Napoleão III (de que falaremos mais adiante), e apoiado por um grande valido, Cavour, haveria de retormar esta guerra saindo desta feita trinfante. A Sul, era outro heroi da independência que haveria de conquistar o Reino das Duas Sicilias, o famoso Garibaldi, dando um passo decisivo para a unidade Italiana. Mas para se completar este ramalhete faltavam os Estados Pontifícios, que era uma imensa parcela de território no centro de Itália, que estavam na posse da Santa Sé. E é aqui que, na minha opinião, reside a popularidade da Rainha Maria Pia. O exército de Victor Emanuel II invadiu militarmente estes territórios que se encontravam na soberania de Roma em 1870, levando o papa Pio IX, confinado ao Vaticano, a declarar-se prisioneiro. Este momento foi uma autêntica certidão de nascimento do Estado de Itália, e foi visto pelas forças progressistas como a vitória do mundo secular  sobre o clero, atingindo o seu máximo representante. Por isso Vitor Emanuel II, que era um monarca, sempre teve neste Portugal Liberal onde já se trilhavam os caminhos da República, uma imensa aura de prestígio que foi transferida para a sua filha, aquela menina que chegaria com apenas 14 anos a Portugal no dia 5 de Outubro de 1862 e que por cá ficaria precisamente 48 anos.

No caso de Dª Amélia, a história muda completamente de figura. A última raínha era filha do Conde de Paris, Luís Filipe de Orleães, pretendente do trono de França e neto do Rei seu homónimo, que reinou em França entre 1830 e 1848. A casa de Orleães era um ramo menor da Dinastia Borbon, que assumiu o trono após o desastrado reinado de Carlos X.

 Após a decapitação de Luís XVI  e do processo revolucionário liderado por Robespierre, que permitiu a ascensão de Napoleão Bonaparte, a França que se apresentou no Congresso de Viena de 1814/1815, após o fugaz regresso de Napoleão da Ilha de Santa Helena, restaurou a monarquia dos Borbons na figura de um irmão do rei decapitado, que reinou com o nome de Luís XVIII. Era um rei liberal, que percebeu que, apesar da restauração, os tempos tinham mudado e os poderes do Rei seriam necessariamente mais limitados. Foi um reinado relativamente pacífico, que não teve continuidade com o seu irmão e sucessor, Carlos X, que se comportou como um autêntico Rei Absoluto. Numa França ainda a fervilhar, houve um levantamento popular em 1830 e este este Rei foi obrigado a abdicar do trono. Abdicou num seu filho, mas que não foi reconhecido, passando a coroa para a casa de Orleães, na figura de Luís Filipe, Conde de Paris. Este monarca era de uma grande lucidez política, que se traduziu em algo que parece à primeira vista apenas uma questão de semântica, mas que foi determinante para se manter 18 anos no poder, apesar das constante revoltas das diferentes facções que se digladiavam no poder, desde legitimistas borbónicos, a napoleónicos e republicanos. Ele não se intitulou Rei de França, mas simplesmente Rei dos franceses. Ou seja, ele reconhecia que o poder emanava do Povo, de quem a Coroa dependia. No meio destes tumultos, a que se associou a burguesia que ia robustecendo o seu poder, foi afastado do trono em 1848, com a proclamação da República, que mais tarde degeneraria, por via plebiscitária, no Império de Napoleão III, abdicando o Conde de Paris no seu neto, também Luís Filipe, e que foi o pai da nossa Rainha Dona Amélia.

Ou seja, os republicanos portugueses viam D.Luís Filipe como um empecilho para as forças progressistas e republicanas, que tentavam tornar a França num estado avançado, e cuja luta os fascinava. Convém recordar que naquela altura a França era o farol do mundo. A intelectualidade portuguesa bebia avidamente tudo o que vinha de França, desde livros a jornais (com muitos dias de atraso), pelo que as revoltas francesas tinham uma repercussão enorme em Portugal, e seriam de certa forma inspiradoras para as lutas domésticas que travavam..

Com a República, após a queda de Luís Filipe, um sobrinho do antigo Imperador Napoleão Bonaparte apresentou-se a votos, ganhando a eleição por larga margem. Ao futuro Napoleão III, bem se podia aplicar aquela estrofe que Camões, jocosamente, dedica a Braz de Albuquerque, filho de Afonso de Albuquerque, Vice Rei da Índia, chamando-lhe avarento lisonjeiro, que apenas “doce sombras apresenta”. Ou seja, o seu único mérito era ser filho de um grande Homem, tal como Napoleão III.

No entanto, este sobrinho de Napoleão foi eleito presidente da República e mais tarde, por via plebiscitária, Imperador. Manteve o título até à Guerra Franco-prussiana de 1870, onde saiu derrotado e que culminou com a Comuna de Paris, no que foi o último sopro de chefia hereditária da História Francesa até à data.

A este processo assistiu o pai da Rainha Dª Amélia como um dos pretendentes ao trono, posição sempre ingrata, seja em república, seja em monarquia, mas ainda mais numa mescla de ambos os sistemas.

Evidentemente que a filha do Conde de Paris trazia consigo essa impopularidade, a quem os republicanos não poupavam nos epítetos, tentando passar a imagem de uma rainha beata, conservadora, saudosista do antigo regime, sem que nada se possa provar, a partir da sua conduta, do que lhe imputavam.

A simpatia que Dona Maria Pia granjeava, pela afronta do seu pai ao papa, antagonizava com a antipatia de Dª Amélia, filha do pretendente monárquico ao trono de França, país que se tornou definitivamente uma república em 1870, período em que o Partido Republicano Português começou a ganhar protagonismo político em Portugal.

No entanto, a dívida de gratidão que o país devia a Dª Amélia foi ainda paga em vida, com o apoio que o país lhe deu na França ocupada, mas sobretudo pela viagem que realizou ao nosso país no pós-guerra, onde visitou os locais que frequentou na sua juventude, e em que foi sempre acompanhada por banhos de multidão, cuja manifestação de afecto muito a sensibilizara.

No caso de Dª Maria Pia, que tal como a sua nora embarcou na Ericeira no dia 5 de Outubro de 1910, nunca chegou a regressar à sua pátria. Talvez um dia possam os seus despojos ocupar o lugar que lhe pertence em São Vicente de Fora.

Apesar de tudo o que referi sobre estas 2 mulheres, hoje ninguém discute que foram 2 grandes rainhas, a quem Portugal muito deve.

publicado por Rui Romão às 18:18
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Domingo, 10 de Fevereiro de 2008

O Dia do Regicídio - 100 Anos Depois (parte III)

Deixo-vos o relato, na primeira pessoa, de como D. Manuel viveu os seus últimos e dramáticos minutos como infante. Eis a minha singela homenagem a esta família, que é também a minha.

“Há já uns poucos de dias que tinha a ideia de escrever para mim estas notas intimas, desde o dia 1 de Fevereiro de 1908, dia do horroroso atentado no qual perdi barbaramente assassinados o meu querido Pae e o meu querido Irmão. Isto que aqui escrevo é ao correr da pena mas vou dizer franca e claramente e também sem estilo tudo o que se passou. Talvez isto seja curioso para mim mesmo um dia se Deus me der vida e saúde. Isto é uma declaração que faço a mim mesmo. Como isto é uma historia intima do meu reinado vou inicia-la pelo horroroso e cruel atentado.

No dia 1 de Fevereiro regressavam Suas Magestades El-Rei D. Carlos I a Rainha a senhora D. Amélia e Sua Alteza o Principe Real de Villa Viçosa onde ainda tinha ficado. Eu tinha vindo mais cedo (uns dias antes) por causa dos meus estudos de preparação para a Escola Naval. Tinha ido passar dois a Villa Viçosa tinha regressado novamente a Lisboa.

Na capital estava tudo num estado excitação extraordinária: bem se viu aqui no dia 28 de Janeiro em que houve uma tentativa de revolução a qual não venceu. Nessa tentativa estava implicada muita gente: foi depois dessa noite de 28, que o Ministro da Justiça Teixeira d'Abreu levou a Villa Viçosa o famoso decreto que foi publicado em 31 de Janeiro. Foi uma triste coincidência ter rubricado nesse dia de aniversário da revolta do Porto. Meu Pae não tinha nenhuma vontade de voltar para Lisboa. Bem lembro que se estava para voltar para Lisboa 15 dias antes e que meu Pae quis ficar em Villa Viçosa: Minha Mãe pelo contrário queria forçosamente vir. Recordo-me perfeitamente desta frase que me disse na vespera ou no próprio dia que regressei a Lisboa depois de eu ter estado dois dias em Villa Viçosa. "Só se eu quebrar uma perna é que não volto para Lisboa no dia 1 de Fevereiro. Melhor teria sido que não tivessem voltado porque não tinha eu perdido dois entes tão queridos e não me achava hoje Rei! Enfim, seja feitaaVossa vontade Meu Deus!

Mas voltando ao tal decreto de 31 de Janeiro. Já estavam presas diferentes pessoas politicas importantes. António José d'Almeida, republicano e antigo deputado, João Chagas, republicano, João Pinto dos Santos, dissidente e antigo deputado, Visconde de Ribeira Brava e outros. Este António José d'Almeida é um dos mais sérios republicanos e é um convicto, segundo dizem. João Pinto dos Santos, é também um dos mais sérios do seu partido. O Visconde de Ribeira Brava, não presta para muito e tinha sido preso com as armas na mão no dia 28 de Janeiro. Mas o António José d'Almeida e João Pinto dos Santos não podiam ser julgados senão pela Câmara como deputados da última Câmara. Ora creio que a tensão do Governo era mandar alguns para Timor tirando assim por um decreto dictatorial um dos mais importantes direitos dos deputados. O Conselheiro José Maria de Alpoim par do Reino e chefe do partido dissidente tinha tido a sua casa cercada pela policia mas depois tinha fugido para Espanha. Um outro dissidente também tinha fugido para Espanha e lá andou disfarçado. Outro que tinha sido preso foi o Afonso Costa: este é do pior do que existe não só em Portugal mas em todo mundo; é medroso e covarde, mas inteligente e para chegar aos seus fins qualquer pouca vergonha lhe é indiferente. Mas isto tudo é apenas para entrar depois mais detalhadamente na história íntima do meu reinado.

Como disse mais atrás eu estava em Lisboa quando foi 28 de Janeiro; houve uma pessoa minha amiga (que se não me engano foi o meu professor Abel Fontoura da Costa) que disse a um dos Ministros que eu gostava de saber um pouco o que se passava, porque isto estava num tal estado de excitação. O João Franco escreveu-me então uma carta que eu tenho a maior pena de ter rasgado, porque nessa carta dizia-me que tudo estava sossegado e que não havia nada a recear! Que cegueira!

Mas passemos agora ao fatal dia 1 de Fevereiro de 1908 sábado. De manhã tinha eu tido o Marquês Leitão e o King. Almocei tranquilamente com o Visconde d'Asseca e o Kerausch. Depois do almoço estive a tocar piano, muito contente porque naquele dia dava-se pela primeira vez "Tristão e Ysolda" de Wagner em S. Carlos. Na vespera tinha estado tocando a 4 mãos com o meu querido mestre Alexandre Rey Colaço o Septuor de Beethoven, que era, e é uma das obras que mais aprecio deste génio musical. Depois do almoço à hora habitual quer dizer às 13:15h comecei a minha lição com o Fontoura da Costa, porque ele tinha trocado as horas da lição com o Padre Fiadeiro. A hora do Fontoura era às 17:30h. acabei com o Fontoura às 15 horas e pouco depois recebi um telegrama da minha adorada Mãe dizendo-me que tinha havido um descarrilamento na Casa-Branca, mas não tinha acontecido nada, mas que vinham com três quartos de hora de atraso. Vendo que nada tinha acontecido dei graças a Deus, mas nem me passou pela mente, como se pode calcular o que havia de acontecer. Agora pergunto-me eu aquele descarrilamento foi um simples acaso? Ou foi premeditado para que houvesse um atraso e se chegasse mais tarde? Não sei. Hoje fiquei em dúvida. Depois do horror que se passou fica-se duvidando de muita coisa. Um pouco depois das 4 horas saí do Paço das Necessidades num "landau" com o Visconde d'Asseca em direcção ao Terreiro do Paço para esperarmos Suas Magestades e Alteza. Fomos pela Pampulha, Janelas Verdes, Aterro e Rua do Arsenal. Chegámos ao Terreiro do Paço. Na estação estava muita gente da corte e mesmo sem ser. Conversei primeiro com o Ministro da Guerra Vasconcellos Porto, talvez o Ministro de quem eu mais gostava no Ministério do João Franco. Disse-me que tudo estava bem.

Esperamos muito tempo; finalmente chegou o barco em que vinham os meus Paes e o meu Irmão. Abracei-os e viemos seguindo até a porta onde entramos para a carruagem os quatro. No fundo a minha adorada Mãe dando a esquerda ao meu pobre Pae. O meu chorado Irmão deante do meu Pae e eu deante da minha mãe. Sobretudo o que agora vou escrever é que me custa mais: ao pensar no momento horroroso que passei confundem-se-me as ideias. Que tarde e que noite mais atroz! Ninguem n'este mundo pode calcular, não, sonhar o que foi.creio que só a minha pobre e adorada Mãe e Eu podemos saber bem o que isto é! vou agora contar o que se passou n'aquella historica Praça.

Sahimos da estação bastante devagar. Minha mãe vinha-me a contar como se tinha passado o descarrilamento na Casa-Branca quando se ouvio o primeiro tiro no Terreiro do Paço, mas que eu não ouvi: era sem duvida um signal: signal para começar aquella monstrosidade infame, porque pode-se dizer e digo que foi o signal para começar a batida. Foi a mesma coisa do que se faz n'uma batida às feras: sabe-se que tem de passar por caminho certo: quando entra n'esse caminho dá-se o signal e começa o fogo! Infames! Eu estava olhando para o lado da estatua de D. José e vi um homem de barba preta , com um grande "gabão". Vi esse homem abrir a capa e tirar uma carabina. Eu estava tão longe de pensar n'um horror d'estes que me disse para mim mesmo, sabendo o estado exaltação em que isto tudo estava "que má brincadeira". O homem sahiu do passeio e veio se pôr atraz da carruagem e começou a fazer fogo.

Faço aqui um pequeno desenho para mesmo me ajudar.





1) Estátua de D. José
2) Sítio onde estava o Buissa o homem das barbas
3) Lugar onde elle começou a fazer fogo
4) Sítio aproximadamente onde devia estar a carruagem Real quando o homem começou a fazer fogo
5) Portão do Arsenal
6) Praça do Pelourinho
7) Sítio aproximadamente donde sahiu o tal Costa que matou o meu Pae.

Quando vi o tal homem das barbas que tinha uma cara de meter medo, apontar sobre a carruagem percebi bem, infelizmente o que era. Meu Deus que horror. O que então se passou só Deus minha mãe e eu sabemos;(...).

«(...) O que então se passou. Só Deus minha Mãe e eu sabemos; porque mesmo o meu querido e chorado Irmão presenceou poucos segundos porque instantes depois também era varado pelas balas. Que saudades meu Deus! Dai-me a força Senhor para levar esta Cruz, bem pesada, ao Calvário! Só vós, Meu Deus sabeis o que tenho sofrido!

Logo depois do Buíça ter feito fogo (que eu não sei se acertou) começou uma perfeita fuzilada, como numa batida às feras! Aquele Terreiro do Paço estava deserto nenhuma providência! Isso é que me custa mais a perdoar ao João Franco. Se durante o seu ministério sobretudo na parte da ditadura cometeu erros isso para mim é menos. Tenho a certeza que a sua intenção era muito boa; os meios é que foram maus, péssimos, pois acabou da maneira mais atroz que jamais se poderia imaginar. Quando se lhe dizia que isto ia mal que havia anarquistas no nosso País ele não acreditou. O primeiro sintoma que eu me lembro de ter havido foi a explosão daquelas bombas na Rua de Santo António à Estrela. Recordo-me perfeitamente a impressão que me fez quando soube! Foi no Verão estávamos então na Pena. Quem me diria o que havia de acontecer 6 ou 8 meses depois! Mas voltando novamente ao pavoroso atentado.

Sei de um dos comandantes da polícia o Coronel Correia estava muito inquieto e o João Franco não acreditava que pudesse ter lugar qualquer coisa desagradável, quanto menos um horror destes, e infelizmente não estavam tomadas providências nenhumas.

Imediatamente depois do Buíça começar a fazer fogo saiu de debaixo da Arcada do Ministério um outro homem que desfechou uns poucos de tiros à queima-roupa sobre o meu Pai; uma das balas entrou pelas costas e outra pela nuca, que O matou instantaneamente. Que infames! para completarem a sua atroz malvadez e sua medonha covardia fizeram fogo pelas costas. Depois disto não me lembro quase do resto: foi tão rápido! Lembra-me perfeitamente de ver a minha adorada e heróica Mãe de pé na carruagem com um ramo de flores na mão gritando àqueles malvados animais, porque aqueles não são gente «infames, infames».

A confusão era enorme. Lembra-me também e isso nunca poderei esquecer, quando na esquina do Terreiro do Paço para a Rua do Arsenal, vi o meu Irmão em pé dentro da carruagem com uma pistola na mão. Só digo d'Ele o que o Cónego Aires Pacheco disse nas exéquias nos Jerónimos: «Morreu como um herói ao lado do seu Rei»! Não há para mim frase mais bela e que exprima melhor todo o sentimento que possa ter.

Meu Deus que horror! Quando penso nesta tremenda desgraça, ainda me parece um pesadelo!

Quando de repente já na Rua do Arsenal olhei para o meu queridíssimo Irmão vi-O caído para o lado direito com uma ferida enorme na face esquerda de onde o sangue jorrava como de uma fonte! Tirei um lenço da algibeira para ver se lhe estancava o sangue: mas que podia eu fazer? O lenço ficou logo como uma esponja.

No meio daquela enorme confusão estava-se em dúvida para onde devia ir a carruagem: pensou-se no hospital da Estrela, mas achou-se melhor o Arsenal. Eu também, já na Rua do Arsenal fui ferido num braço por uma bala. Faz o efeito de uma pancada e um pouco uma chicotada: foi na parte superior do braço direito.

Agora que penso ainda neste pavoroso dia e no medonho atentado parece-me e tenho quase a certeza (não quero afirmar porque nestes momentos angustiosos perde-se a noção das coisas) que eu escapei por ter feito um movimento instintivo para o lado esquerdo.

Na segunda carruagem vinham os Condes de Figueiró e o Marquês de Alvito e na terceira o Visconde de Asseca, o Vice-Almirante Guilherme A. de Brito Capelo e o Major António Waddington. Quando vínhamos a entrar o portão do Arsenal a Condessa de Figueiró entrou também na nossa carruagem e lembra-me que o Visconde de Asseca e o Conde de Figueiró vinham ao lado da carruagem. Dentro do Arsenal saí da carruagem primeiro e depois a minha adorada Mãe. Foi verdadeiramente um milagre termos escapado: Deus quis poupar-nos! Dou Graças a Deus de me ter deixado a minha Mãe que eu tanto adoro. Sempre foi a pessoa que eu mais gostei neste mundo e no meio destes horrores todos dou e darei sempre graças a Deus de me A ter conservado!

Quando a Minha adorada Mãe saiu da carruagem foi direita ao João Franco que ali estava e disse-lhe ou antes gritou-lhe com uma voz que fazia medo «Mataram El-Rei: Mataram o meu Filho». A minha pobre Mãe parecia doida. E na verdade não era para menos: Eu também não sei como não endoideci. O que então se passou naquelas horas no Arsenal ninguém pode sonhar! A primeira coisa foi que perdi completamente a noção do tempo. Agarrei a minha pobre e tão querida Mãe por um braço e não larguei e disse à Condessa de Figueiró para não a deixar.

Contudo ia entrando muita gente da Casa, diplomatas, os ministros e mesmo ministros de Estado honorários.

Estava-se ainda na dúvida (infelizmente de pouca duração se ainda viviam os dois entes tão queridos! Estavam lá muitos médicos entre outros o Dr. Bossa (que me parece foi o primeiro que chegou) o Dr. Moreira Júnior e o Dr. D. António Lencastre. Contou-me depois (já alguns dias depois) o Dr. Bossa que logo que chegou acendeu um fósforo e ainda as pupilas se retraíram. Quando porém repetiu a experiência nem mesmo esse pequeno sinal de vida lhe restava.

Descansa em paz no sono Eterno e que Deus tenha a Tua Alma na sua Santa Guarda!

De meu Pai e mesmo meu Irmão não tinha grandes esperanças que pudessem escapar. As feridas eram tão horrorosas que me parecia impossível que se salvassem. Como disse já lá estava o Ministério todo menos o Ministro da Fazenda Martins de Carvalho.

Isso é que nunca poderei esquecer é que fazendo parte do Ministério do meu querido Pai quando foi assassinado não foi ao Arsenal! Diz-se (não o quero afirmar) que fugiu para as águas-furtadas do Ministério da Fazenda e ali fechou a porta à chave! seja como for há agora seis meses que Meu Pai e Meu Irmão de chorada memória foram assassinados e nunca mais aqui pôs os pés! Acho isso absolutamente extraordinário!... para não dizer mais.

Preveniu-se para o Paço da Ajuda a minha pobre Avó para vir para o Arsenal. Eu não estava quando Ela chegou. Estavam-me a tratar o braço na sala do Inspector do Arsenal.

Quando a Avó chegou foi direita à minha Mãe e disse-lhe «On a tué mon fils!» e a minha Mãe respondeu-lhe: «Et le mien aussi!» Meu Deus dai-me força. Mas antes disto houve diferentes coisas que quero contar.

A minha pobre e adorada Mãe andava comigo pelo Arsenal de um lado para o outro com diferentes pessoas: Conde de Sabugosa, Condes de Figueiró, Condes de Galveias e outros falando de sempre num estado de excitação indescritível mas fácil de compreender. De repente caiu no chão! Só Deus e eu sabemos o susto que eu tive! Depois do que tinha acontecido veio aquela reacção e eu nem quero dizer o que primeiro me passou pela cabeça.

Depois vi bem o que era: o choque pavoroso fazia o seu efeito! Minha Mãe levantou-se quase envergonhada de ter caído. É um verdadeiro herói. Quem dera a muitos homens terem a décima parte da coragem que a minha Mãe tem.

Tem sido uma verdadeira mártir! O que eu rogo a Deus sempre e a cada instante é para m'A conservar!

Pouco tempo depois de termos chegado ao Arsenal veio ainda o major Waddington dizendo que os Queridos Entes ainda estavam vivos; mas infelizmente pouco tempo depois voltou chorando muito. Perguntei-lhe «Então?» Não me respondeu. Disse-lhe que tinha força para ouvir tudo. respondeu-me então que já ambos tinham falecido! Dai-lhes Senhor o Eterno descanso e brilhe sobre Eles a Vossa Luz Eterna Ámen!

Pouco depois vi passar João Franco com o Aires de Ornelas (Ministro da Marinha) e talvez (disso não me lembro ao certo) com o Vasconcelos Porto, Ministro da Guerra, dirigindo-se para a Sala da Balança para telefonarem que se tomassem todas as previdências necessárias. São isto cenas, que viva eu cem anos, ficarão gravadas no meu coração. Agora já era noite o que ainda tornava tudo mais horroroso e sinistro: estava já então muita gente no Arsenal, e principiou-se a pensar no regresso para o Paço das Necessidades. No presente momento em que estou escrevendo estas linhas estou repassando com horror, tudo no meu pensamento! Entrámos então para o landau fechado, a minha Avó, minha Mãe e o Conde de Sabugosa e eu. Saímos do Arsenal pelo portão que deita para o Cais do Sodré onde estava um esquadrão da Guarda Municipal comandado pelo Tenente Paul: Na almofada ia o Coronel Alfredo de Albuquerque: à saída entregaram ao Conde de Sabugosa um revólver; minha Avó também queria um.

Viemos então a toda brida para o Paço das Necessidades. À entrada esperavam-nos a Duquesa de Palmela, Marquesa do Faial, Condessa de Sabugosa, Dr.D.Thomaz de Mello Breyner, Conde de Tattenbach, Ministro da Alemanha e a Condessa, e muitos criados da casa. Foi uma cena horrorosa! Todos choravam aflitivamente. Subimos muito vagarosamente a escada no meio dos prantos e choros de todos os presentes. Acompanhei a minha pobre e adorada Mãe até ao seu quarto e deixei a minha pobre Avó na sala.


publicado por Rui Romão às 11:08
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Terça-feira, 5 de Fevereiro de 2008

O Dia do Regicídio - 100 Anos depois (Parte II)

 16:30 – Em Direcção ao Terreiro do Paço.

Saio do café gelo e dirijo-me para o local do crime.  Passo pela Rua 1º de Dezembro em direccção à  Rua do Ouro. Aí, observo um motociclista que passa com a Bandeira Azul e Branca. É sexta-feira e o trânsito está intenso. Chegado ao Terreiro do Paço deparo-me com uma faixa negra, claramente anarquista, colocada na estátua de D. José, com a inscrição Amo-te. Não sei se se consideram filhos da carbonária, no entanto têm tanto direito a expressar as suas ideias, mesmo que sejam idiotices, como qualquer outro grupo.  

São 17 horas. A este hora, há cem anos atrás, o vapor D. Luis já estaria a beijar o Cais das Colunas, com a família Real e toda a comitiva a bordo. O Rei regressava do seu retiro calipolense, onde tinha permanecido durante todo o mês de Janeiro. D Manuel refere na sua descrição do regicídio que o monarca tinha expressado o seu desejo inexorável de regressar à Capital nos seguintes termos  “só se quebrar uma perna é que não regressarei a Lisboa no dia 1 de Fevereiro”. Antes tivesse quebrado e poupar-nos-ia a esta tragédia.   Nesse mesmo dia, a comitida tinha ficado retida em Casa Branca devido a um descarrilamento. De resto, seria este acontecimento que o Príncipe D. Luis Filipe relatava a D. Manuel quando se deu início ao atentado.

100 anos depois, também experimentei a sensação de cruzar o Tejo, do Barreiro ao Terreiro do Paço. Não num vapor, mas a bordo de um moderno catamarã. Foi de manhã, mas não desembarquei no Cais das Colunas, então proscrito, oxalá que por pouco tempo.

D. Manuel tinha antecipado o regresso, por forma a poder preparar a sua entrada  na Escola Naval. Para além do Infante D. Manuel, a família real era esperada no Cais das Colunas pelo Presidente do Conselho, João Franco, pelo Duque do Porto e irmão do Rei, o “motorizado” D. Afonso Henriques, bem como por vários membros da corte.

O momento do desembarque do monarcas ficou imortalizado pela “chapa” de Joshua Benoliel. À saída do vapor D. Luis, foi oferecido um ramo de rosas à Rainha, que viria a servir de arma contra os regicídas. À saída do Cais das Colunas, D. Carlos troca umas breves palavras com João Franco, ficando combinada uma reunião mais detalhada no Palácio das Necessidades. João Franco tinha colocado à disposição do Rei um automóvel, oferta recusada imediatamente. Chegados ao landau,  El Rei mandou recolher a capota, que então cobria a carruagem. Era um Sábado solarengo, e o Rei queria mostrar a todos que não se escondia. “As minhas pistolas estão sempre carregadas” retorquia.

As 17:15 tiveram início as cerimónias. O local do fatídico atentado primava pela discrição. Uma tarja alusiva à Comissão D. Carlos 100 suspensa entre duas colunas no lado ocidental do Terreiro do Paço e uns suportes publicitários com imagens do Rei, sob o título “Um Rei Constitucional”. Na esquina com a Rua do Arsenal, onde Bento Caparica, o cocheiro real, conduziu a carruagem desgovernada no meio da chuva de balas, algumas centenas de pessoas vão-se aglomerando para assitir à cerimónia. Identifico 3 elementos da banda do Colégio Militar, instituição  de que  o Rei e o Príncipe Real  foram comandantes de batalhão  honorários. Neste momento não posso deixar de lamentar a proibição do ministro da Defesa, Severiano Teixeira, à última hora, da participação da Banda do Exército nas cerimónias.  Para além do aparato das televisões e dos reporteres, identifico Gonçalo Ribeiro Telles, Rui Carp, Miguel Sousa Tavares e Miguel Horta e Costa, este último na condição de membro da Comissão D. Carlos 100 anos.

A chegada do Duque de Bragança foi bastante aplaudida, onde não faltou o “viva o Rei”, no entanto D. Duarte não proferiu nenhum discurso. A sua participação  revestiu-se de maior simbolismo no momento da colocação de uma coroa de flores, em parceria com o seu filho Afonso, Príncipe da Beira, por debaixo da lápide alusiva ao regicídio.

A presente lápide foi inaugurada por ocasião do 98º aniversário do atentado, às expensas da Real Associação de Lisboa. Muitos anos antes, quando Portugal era ainda um reino, existiu um homem que se bateu, praticamente sozinho, pela colocação de uma placa evocativa desta trágica efeméride. Esse homem foi Bernardo Pinheiro Correia de Mello, Conde de Arnoso, uma das figuras de maior destaque no meio intelectual português do final do século XIX. Amigo de Eça, a quem lhe trouxe uma “Cabaia” numa viagem oficial que fez à China -  que podemos apreciar na Fundação Eça de Queirós, na sua “Tormes” -  fez parte de um grupo de jovens intelectuais do seu tempo, onde figuravam alguns republicanos como Guerra Junqueiro, os auto-designados “Vencidos da Vida”. Foi igualmente, em conjunto com Ramalho Ortigão, o maior dinamizador da construção da estátua do romancista, onde ainda hoje se encontra uma réplica, no Largo Barão de Quintela. A sua insistência na defesa da colocação da lápide evocativa do regicídio grangeou-lhe, nos meios republicanos, a alcunha de “Conde da Lápide”.

Às 17:20 o landau inicia a sua marcha.

  

publicado por Rui Romão às 11:50
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2008

O Dia do Regicídio - 100 anos depois (Parte 1)

Café Gelo – 16:00 dia 1 de Fevereiro de 2008.

Aquilino Ribeiro chamou-lhe a sede da ala demagógica da Carbonária. Centro conspirativo por excelência, o Café Gelo  funcionou como uma espécie de sede  “informal” da ala mais radical da maçonaria. O regicídio foi urdido nestas 4 paredes, ou pelo menos o assassínio de uma figura importante do regime. Aquilino, revolucionário confesso, refere que o objectivo era matar o presidente do Conselho, João Franco, qualificando o assassinato do Rei de um “grande desacerto”. Infelizmente, não acredito nem na cândida inocência do autor de ”Quando os Lobos Uivam”, nem tão pouco na sua absolvição de participação em actividades criminosas, mais concretamente num regicídio.

Como seria diferente a Lisboa nos tempos em que o Café Gelo era frequentado pelos Costas (Alfredo e Afonso), Buiça, Aquilino e outros demagogos radicais da Carbonária.   Peço um café e uma “madalena” ao mesmo tempo que não consigo parar de olhar em volta. Da mesa onde me encontro observo o Restaurante Leão D’Ouro, outro local histórico da baixa pombalina. Imortalizado na tela “O Grupo do Leão” pelo mestre Columbano Bordalo Pinheiro,  foi o ponto de encontro e de tertúlia de um destacado grupo de intelectuais no último quartel do século XIX. Entre as figuras célebres desse grupo destacam-se José Malhoa, Silva Porto e Rafael Bordalo Pinheiro, para além do próprio Columbano.

A lado do Leão D’Ouro surge a imponente estação do Rossio. Em estilo neo-manuelino, talvez seja o melhor exemplo que nos ficou do ressurgimento do espírito imperial na Europa.  Foi este movimento que deu origem à Conferência de Berlim de 1884, e que em Portugal resultou, sob o alto patrocínio do Rei D. Luis, à fundação da Sociedade de Geografia. Foi às portas de Santo Antão que começou a ser idealizada uma África portuguesa, de Angola à contra-costa, e que daria origem ao célebre “ultimatum” britânico, que abalou o início do reinado de D. Carlos.  

Foi na então nova estação de Lisboa que, em 1906, o malogrado Príncipe Real D. Luis Filipe, na condição de regente do Reino,  esperou os monarcas de regresso da sua bem sucedida viagem à Espanha de Afonso XIII.

De regresso ao Café Gelo. É um espaço agradável, moderno, com vidros amplos  para o exterior. As  paredes são claras, envoltas com lambrís em mármore escuro. Os candeeiros são em forma quadrangular, cobertos num revestimento branco, conferindo um toque de irreverência ao local. O atendimento é rápido e eficiente. À primeira vista, nada diria que este café teria tanto para contar. Digo à primeira vista porque, numa feliz conjugação entre o passado e o futuro, são várias as pistas que nos levam a concluir que aquele não é um café como os outros.

 

Como referi, estas paredes não deixam de evocar a história que este espaço carrega. Com duas entradas, para o Rossio  e  para a actual  Rua 1º de Dezembro (antiga Rua do Príncipe)  tenho à minha direita várias fotografias do café ao longos do tempo. Começa com uma imagem do início do século XX, contemporâneo da conspiração dos carbonários, continuando com imagens de 1961, quando várias personalidades pertencentes ao movimento modernista frequentavam este local, entre os quais Mário Cesarini,  e  finalmente em 2007, provavelmente por altura da remodelação que deu origem à sua configuração actual.

Atrás de mim, a maior gravura. Compreensivelmente, alusiva ao regicídio. Não se conhecem fotografias do atentado. A razão é simples, os fotografos já se tinham dirigido para o Palácio das Necessidades, local previsto da chegada da comitiva. A última tirada aos monarcas é da autoria de Joshua Benoliel à saída do cais das colunas. Nela se pode ver o rosto apreensivo de D. Carlos e de  Dª Amélia, conscientes do clima conspirativo que os aguardava. O Rei recusou o automóvel que João Franco colocou à sua disposição, preferindo a carruagem aberta, para dar um sinal de normalidade.

O ambiente estava tenso, a revolução de 28 de Janeiro, conhecida como a Revolta da Biblioteca, tinha sido gorada e o desespero era grande entre os conspiradores. O decreto a autorizar o degredo para as colónias, assinado pelo Rei em Vila Viçosa, ainda por cima na data da primeira revolução republicana no Porto (31 de janeiro) foi a pedra de toque para a urdidura.

Em frente do balcão corrido em inox, fotografias de várias personalidades, passando pelo própro Rei D. Carlos, Afonso Costa e Mario Cesarini, para citar apenas alguns. Na porta de acesso ao Rossio, uma grande placa expõe, sumariamente, a história do café, evocando o regicídio, bem como o movimento de contestação ao regime de Salazar.   

publicado por Rui Romão às 18:29
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